Apresentação

A Revista Domingueira da Saúde é uma publicação semanal do Instituto de Direito Sanitário - IDISA em homenagem ao Gilson Carvalho, o idealizador e editor durante mais de 15 anos da Domingueira da Saúde na qual encaminhava a mais de 10 mil pessoas informações e comentários a respeito do Sistema Único de Saúde e em especial de seu funcionamento e financiamento. Com a sua morte, o IDISA, do qual ele foi fundador e se manteve filiado durante toda a sua existência, com intensa participação, passou a cuidar da Domingueira hoje com mais de 15 mil leitores e agora passa a ter o formato de uma Revista virtual. A Revista Domingueira continuará o propósito inicial de Gilson Carvalho de manter todos informados a respeito do funcionamento e financiamento e outros temas da saúde pública brasileira.

Editores Chefes
Áquilas Mendes
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Lenir Santos

Conselho Editorial
Élida Graziane Pinto
Nelson Rodrigues dos Santos
Thiago Lopes Cardoso campos
Valéria Alpino Bigonha Salgado

ISSN 2525-8583



Domingueira nº 26 - Agosto 2023

Índice

  1. O papel da enfermagem no cuidado à saúde - por Carmino de Souza

O papel da enfermagem no cuidado à saúde

Por Carmino de Souza


Sou médico formado há quase 50 anos e sou professor de medicina da Universidade de Campinas (UNICAMP) desde 1979 sendo Titular de Hematologia, Hemoterapia e Terapia Celular do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Ciências Médicas desde 2001. Durante este longo trajeto de trabalho e atividades acadêmicas e de extensão pude acompanhar e apoiar fortemente o multiprofissionalismo e a multidisciplinariedade na área da saúde.

Acredito que o médico mantém a sua liderança natural e histórica, aceita pela sociedade, mas, hoje e nunca mais poderemos prescindir do trabalho de nossos colegas de outras profissões de saúde. Em relação a enfermagem, isto é nuclear. Existem aproximadamente 28 milhões de enfermeiros em todo o mundo, representando 60% da força de trabalho global em saúde. No entanto, há má distribuição global da proporção da população de enfermeiros de 12 enfermeiros por 1.000 habitantes em países de alta renda versus um enfermeiro ou menos por 2.000 habitantes em países de baixa e média renda.

Os enfermeiros costumam ser o primeiro ponto de contato para um paciente que se apresenta em um serviço de saúde e costumam passar mais tempo com o paciente em comparação com outros profissionais de saúde. Os enfermeiros são intrínsecos ao bom funcionamento dos sistemas de saúde em todo o mundo. Sem sua presença 24 horas e suas habilidades especializadas em cuidar de pacientes, a saúde, como a conhecemos, estaria em piores condições.

Para que os enfermeiros funcionem de forma otimizada em qualquer sistema de saúde, a liderança em enfermagem, que é “liderança feita pelos próprios enfermeiros”, precisa ser apoiada e exercida. O advento da Covid-19 expôs ainda mais as lacunas em nossos sistemas de saúde existentes e destacou a necessidade de uma inclusão deliberada e intencional de sistemas de saúde de liderança em enfermagem, especialmente na preparação para futuras pandemias ou crises sanitárias.

Os enfermeiros desempenham um papel extremamente importante na saúde global porque a própria natureza do seu trabalho tem o potencial de reduzir as disparidades de saúde e alcançar melhores resultados de saúde para os pobres, vulneráveis e marginalizados na sociedade. Em países de baixa e média renda, os enfermeiros podem ser os únicos profissionais de saúde que uma pessoa doente verá.

Sem enfermeiros e os enfermeiras, os atuais “Objetivos de Desenvolvimento Sustentável”, “Cobertura Universal de Saúde”, “Atenção Básica à Saúde”, segurança global da saúde, metas e prioridades de preparação para pandemias não podem ser alcançados, particularmente em países de baixa e média renda, onde sua obtenção é de valor crucial, e onde ainda há uma luta enorme para alcançá-los.

Apesar de seu papel crítico na prestação de saúde à população, a profissão de enfermagem enfrenta inúmeros desafios, principalmente em países de baixa e média renda, incluindo:

• Integração profissional, poder e posição particularmente com a comunidade médica;

• Falta de trajetórias educacionais padronizadas – entrada na enfermagem, progressão na carreira, especialização;

• Subfinanciamento;

• Falta de inclusão e representação na tomada de decisão na formulação de políticas e espaços de liderança.

Algumas regiões do Brasil, são muitas vezes sobrecarregados com lacunas na prestação de cuidados de saúde devido a uma baixa relação médico-paciente, recursos inadequados nos hospitais e uma população em rápido crescimento. Investir em educação e pesquisa em enfermagem é fundamental para enfrentar essa escassez.

A OMS recomenda que as nações otimizem o uso de enfermeiros para a prevenção e controle de doenças não transmissíveis. Os enfermeiros têm o potencial de aumentar a conscientização sobre doenças para a população em geral e a adesão ao rastreamento, gerenciamento ou medidas preventivas de doenças. Revisões sistemáticas relataram o impacto positivo dos resultados comportamentais e de qualidade de vida em intervenções lideradas por enfermeiras relacionadas à promoção psicossocial e de estilo de vida saudável, embora a maioria dessas evidências seja de países de alta renda.

Enfermeiros, muitas vezes, são colocados em tarefas como documentação ou procedimentos repetitivos. Os papéis propostos para enfermeiros de prática avançada incluem gerente de caso, educador clínico, pesquisador clínico, assistente clínico, enfermeiro comunitário e gerente de atendimento ao paciente. Para continuar avançando no papel dos enfermeiros, precisamos de um órgão global de enfermagem que regule esses papéis, especialmente nos países de baixa e média renda.

A capacitação de enfermeiros também deve incluir a introdução de tópicos de informática em saúde, saúde digital e ciência de dados no currículo de enfermagem atual, para que soluções de saúde digital possam ser planejadas e gerenciadas.

Precisamos fortalecer a profissão de enfermagem por meio da prática, da pesquisa e das atividades acadêmicas.

Sem enfermeiros não temos cuidados adequados à saúde.


Carmino Antônio De Souza é professor titular da Unicamp. Foi secretário de saúde do estado de São Paulo na década de 1990 (1993-1994) e da cidade de Campinas entre 2013 e 2020. Secretário-executivo da secretaria extraordinária de ciência, pesquisa e desenvolvimento em saúde do governo do estado de São Paulo em 2022 e atual Presidente do Conselho de Curadores da Fundação Butantan.




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