Apresentação

A Revista Domingueira da Saúde é uma publicação semanal do Instituto de Direito Sanitário - IDISA em homenagem ao Gilson Carvalho, o idealizador e editor durante mais de 15 anos da Domingueira da Saúde na qual encaminhava a mais de 10 mil pessoas informações e comentários a respeito do Sistema Único de Saúde e em especial de seu funcionamento e financiamento. Com a sua morte, o IDISA, do qual ele foi fundador e se manteve filiado durante toda a sua existência, com intensa participação, passou a cuidar da Domingueira hoje com mais de 15 mil leitores e agora passa a ter o formato de uma Revista virtual. A Revista Domingueira continuará o propósito inicial de Gilson Carvalho de manter todos informados a respeito do funcionamento e financiamento e outros temas da saúde pública brasileira.

Editores Chefes
Áquilas Mendes
Francisco Funcia
Lenir Santos

Conselho Editorial
Élida Graziane Pinto
Marcia Scatolin
Nelson Rodrigues dos Santos
Thiago Lopes Cardoso campos
Valéria Alpino Bigonha Salgado

ISSN 2525-8583



Domingueira Nº 28 - Julho 2020

Índice

  1. Boletim Cofin/CNS 2020/07/08 - por Francisco R. Funcia, Rodrigo Benevides e Carlos Ocke
  2. Breve análise do art. 8º da Lei Complementar 173, no que se refere a despesas com pessoal. - por Valéria Salgado

Boletim Cofin/CNS 2020/07/08

Por Francisco R. Funcia, Rodrigo Benevides e Carlos Ocke


















Francisco R. Funcia, Mestre em Economia Política pela PUCSP, Professor e Coordenador-Adjunto do Observatório de Políticas Públicas, Empreendedorismo e Conjuntura da USCS e Consultor Técnico do Conselho Nacional de Saúde.

Rodrigo Benevides, Economista (UFRJ) e mestre em Saúde Coletiva pelo IMS/UERJ.

Carlos Ocké, Economista e Vice-Presidente da Associação Brasileira de Economia da Saúde - ABrES.



Breve análise do art. 8º da Lei Complementar 173, no que se refere a despesas com pessoal.

Por Valéria Salgado


A Lei Complementar Federal nº 173, de 27 de maio de 2020 (LC173) instituiu o Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus SARS-CoV-2 (Covid-19) e estabeleceu, dentre outros dispositivos, proibições específicas para a gestão de pessoal na Administração Pública, a vigorarem durante a ocorrência de calamidade pública, reconhecida pelos Poderes Legislativos dos Entes da Federação Brasileira. Essas proibições têm vigência até 31 de dezembro de 2021.

De acordo com a citada Lei Complementar:

a) está proibida a concessão de vantagem, aumento, reajuste ou adequação da remuneração dos servidores e empregados públicos, civis e militares, exceto quando determinada por sentença judicial, transitada em julgado ou aprovada por lei, anteriormente à calamidade pública (LC173, art.8º-I). A redação dada ao inciso, em sua parte final, permite entender que as vantagens que, eventualmente, tenham previstas em lei anterior à calamidade, podem ser concedidas, ainda que não tenham sido implementadas até o momento;

b) está proibida a criação de cargo, emprego ou função que implique aumento de despesa (LC173, art.8º-II). Assim, a criação de cargos, empregos ou funções na Administração Pública fica condicionada à extinção de outros cargos, empregos e funções, na mesma medida da nova despesa a ser realizada;

c) está proibida qualquer alteração na estrutura de carreira, que implique em aumento de despesa (LC173, art.8º-III);

d) está proibida a admissão ou contratação de pessoal, a qualquer título (LC173, art.8º-IV). Ficam permitidas, no entanto, para qualquer setor da administração pública, a admissão ou contratação de pessoal que vise, exclusivamente, repor cargos em comissão, sem aumento de despesas, assim como os cargos efetivos ou vitalícios que estivem vagos;

e) as contratações temporárias também são permitidas, em todos os setores, desde que destinadas à atender a necessidade temporária dos serviços; assim como as contratações de temporários para prestação de serviço militar e as contratações de alunos de órgãos de formação de militares (LC173, art.8º-IV);

f) está proibida a realização de concurso público, exceto para repor as vacâncias dos cargos efetivos ou vitalícios vagos (LC173, art.8º-V);

g) está proibida a criação ou o aumento do valor de auxílios, vantagens, bônus, abonos, verbas de representação ou benefícios de qualquer natureza, inclusive os de cunho indenizatório para servidores ou empregados públicos, civis ou militares e para seus dependentes; exceto por sentença judicial, transitada em julgado ou por determinação legal anterior à calamidade pública (LC173, art.8º-VI);

h) está proibida a criação de despesa obrigatória de caráter continuado; com exceção das despesas que decorrem das medidas de combate à calamidade pública, cuja vigência e efeitos não ultrapassem a sua duração. Podem, ainda, ser criadas despesas obrigatórias quando houver prévia compensação pelo aumento de receita ou redução de despesas. Quando houver a previsão de que a despesa ultrapassará dois exercícios financeiros, a compensação deverá ser permanente (LC173, art.8º-VII);

i) está proibida a adoção de medida que implique reajuste de despesa obrigatória acima da variação da inflação, medida pelo IPCA, respeitados os reajustes periódicos do salário mínimo, voltados a preservar o poder aquisitivo dos trabalhadores (LC173, art.8º-VIII); e

j) está proibida a contagem de tempo da pandemia como de período aquisitivo para concessão de anuênios, triênios, quinquênios e licenças-prêmios e demais mecanismos equivalentes que aumentem a despesa com pessoal em decorrência da aquisição de determinado tempo de serviço, sem qualquer prejuízo para o tempo de efetivo exercício, aposentadoria, e quaisquer outros fins (LC173, art.8º-IX).

Nos termos da Lei Complementar nº 173, os setores responsáveis pelas medidas de combate ao Covid-19, como é o caso da saúde, estão isentos de algumas das proibições, desde que para o enfretamento e combate à pandemia, podendo:

I - criar cargos, empregos e funções com aumento de despesa;
II - admitir ou contratar pessoal para provimento de novos postos de trabalho;
III - criar despesas e adotar medidas que gerem reajuste de despesa obrigatória acima da inflação.
O texto legal não deixa claro se seria possível realizar concurso público para o provimento de novos cargos, empregos e funções porventura criados, nos setores envolvidos no combate à pandemia, visto que excepcionaliza a realização de concurso apenas para repor vacâncias em cargos e empregos já existentes.

Finalmente, e apenas para os profissionais de saúde e assistência social efetivamente envolvidos nas atividades de combate à Pandemia do Covid-19, a Lei Complementar permite a criação ou a majoração de auxílios, vantagens, bônus, abonos e verbas de representação.

Como conclusões da análise do texto da Lei Complementar 173, no que se refere à gestão de pessoas, tem-se que:

a) podem ser criados cargos, empregos ou funções desde que não haja aumento de despesa;

b) podem ser realizados concursos públicos, em qualquer área do Setor Público para prover os cargos e empregos vagos, criados antes da pandemia;

c) o concurso público, em geral, para provimento de cargos e empregos criados durante a pandemia está proibido;

d) nos setores envolvidos no combate à pandemia pode haver a criação de cargos, empregos e funções, com aumento de despesa, mas permanece a dúvida da vedação da realização de concurso públicos para o seu provimento. Assim, pode-se entender que a autorização de aumento de despesa restringe-se, de fato, à criação de cargos em comissão e funções comissionadas que prescindem da realização de concurso público. Diante da dúvida, é oportuno que os Governos solicitem aos seus órgãos de assessoramento jurídico o posicionamento sobre a matéria, para evitar surpresas futuras, especialmente, junto aos órgãos de controle externo;

e) a contratação temporária é permitida para todos os setores, desde que seja, exclusivamente, para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público, nos termos do inciso IX do art. 37 da Constituição Federal. Com base nas orientações da Secretaria de Orçamento Federal [1] , acerca do enquadramento das despesas com pessoal contratado por tempo determinado, essas contratações, por não objetivarem a substituição de pessoal do setor público, mas atender às necessidades específicas de pessoal, em especial as decorrentes da pandemia, deverão ser enquadradas como GND3-Outras Despesas Correntes e não como despesa de pessoal (GND1) [2] (Manual SIAFI > 020000 – Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal – SIAFI > 020300 - MACROFUNÇÕES > 020332 - CLASSIFICAÇÕES ORÇAMENTÁRIAS); e

f) as contratações de pessoal por tempo determinado que caracterizem a substituição de servidores e empregados públicos estão proibidas. Aliás, essas contratações, de prática comum na administração pública, salvo melhor juízo, não têm fundamento legal, em nenhuma hipótese ou situação, e constituem um desvirtuamento do instituto do contrato por tempo determinado previsto no inciso IX do art. 37 da Constituição Federal.


[1] Consultar orientações disponíveis nos links abaixo:
https://www1.siop.planejamento.gov.br/mto/doku.php/mto2020:cap9
https://conteudo.tesouro.gov.br/manuais/index.php?option=com_content&view=article&id=1567:020332-classificacoes-orcamentarias&catid=749&Itemid=376

[2] Somente as despesas relativas à contratação de pessoal por tempo determinado que caracterizem substituição de servidores e empregados públicos são classificadas no GND 1, salvo disposição em contrário constante de legislação vigente.


Valéria Salgado: Diretora Regional do IDISA, da Região Centro-Oeste, é pós-graduada em Direito Sanitário pelo IDISA/IEP e em Gestão Pública e Qualidade em Serviços - UFBA. Servidora federal aposentada e atua como consultora na área de gestão pública.




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