Apresentação

A Revista Domingueira da Saúde é uma publicação semanal do Instituto de Direito Sanitário - IDISA em homenagem ao Gilson Carvalho, o idealizador e editor durante mais de 15 anos da Domingueira da Saúde na qual encaminhava a mais de 10 mil pessoas informações e comentários a respeito do Sistema Único de Saúde e em especial de seu funcionamento e financiamento. Com a sua morte, o IDISA, do qual ele foi fundador e se manteve filiado durante toda a sua existência, com intensa participação, passou a cuidar da Domingueira hoje com mais de 15 mil leitores e agora passa a ter o formato de uma Revista virtual. A Revista Domingueira continuará o propósito inicial de Gilson Carvalho de manter todos informados a respeito do funcionamento e financiamento e outros temas da saúde pública brasileira.

Editores Chefes
Áquilas Mendes
Francisco Funcia
Lenir Santos

Conselho Editorial
Élida Graziane Pinto
Marcia Scatolin
Nelson Rodrigues dos Santos
Thiago Lopes Cardoso campos
Valéria Alpino Bigonha Salgado

ISSN 2525-8583



Domingueira Nº 33 - Setembro 2021

Homenagem do IDISA ao grande companheiro Carlos Neder. Esse que defendeu o direito à saúde e apoiou as atividades do Idisa sempre.

Por Lenir Santos


Ao meu querido amigo Carlos Neder

Parem todos os relógios, desliguem o telefone,
Evitem o latido do cão com um osso bem suculento
Silenciem os pianos, e com tambores lentos
Deixem que o luto chore.
W. H. Auden

Conheci Carlos Neder quando ele foi secretário municipal de saúde no governo da Erundina. Eu estava à época no Gabinete da Secretaria de Estado da Saúde na implementação do SUDS, precursor do SUS. Era 1990. Nosso convívio se transformou em amizade e grande admiração minha pelo homem público, dedicado, coerente, amigo, angustiado com as mazelas públicas, que fazia do dialogo a sua atuação política, sem perder a coerência, a honestidade intelectual, a intransigência e a seriedade no trato com a coisa pública.

Foi com muita tristeza e apreensão que acompanhei à distância, ao lado de tantos amigos e admiradores, a sua luta e a de seus familiares contra a covid-19 que o retirou de nosso convívio. Tristeza imensa. Dor pela partida de tão querido amigo. Que a sua travessia para a terceira margem do rio seja a sua redenção e que possamos aqui conviver com a sua lembrança, a saúde e o afeto que dedicou a todos nós.

Lenir Santos
25.09.2021



Importância das universidades para o SUS

Por Carmino de Souza



O HC da Unicamp tem mais dez leitos de UTI Covid em funcionamento. Foto: Arquivo

Sabemos da grandeza, importância e complexidade do SUS. Neste período de pandemia ficou claro para toda sociedade brasileira sua absoluta necessidade. Sempre dizemos e repetimos: sem o SUS este momento seria a “barbárie”. Sabemos ainda que o SUS tem uma organização “piramidal” onde na base da pirâmide estão todas as ações ligadas a atenção básica e no topo da pirâmide estão todos os procedimentos de alta complexidade com destaque aos transplantes, às cirurgias cardíacas, neurológicas, neoplásicas etc., aos tratamentos quimioterápicos e radioterápicos dos tumores malignos, às hemodiálises dentre centenas de outras intervenções para diagnóstico, prognóstico e terapêutica. Distribuído através da pirâmide, todos os outros procedimentos especializados fundamentais a todas as linhas de cuidados oferecidas pelo SUS.

Trata-se, portanto, de um sistema hierarquizado, descentralizado e acessível a todos os cidadãos.

Faz parte ainda do SUS todo o sistema de vigilância em saúde, fundamental para a garantia da qualidade de produtos e serviços oferecidos à população. Neste contexto, como se colocam as universidades? Sem dúvida alguma, o papel das universidades para o SUS é nuclear. As universidades têm o papel contínuo de formar recursos humanos em todos os níveis (graduação, residência médica e multiprofissional e pós-graduação strictu senso – mestrado, doutorado e pós-doutorado) em quantidade e qualidade bem como desenvolver constante trabalho de pesquisas e inovação para o sistema.

Cabe ainda às universidades o ensino de extensão e reciclagem de todos os profissionais já graduados. As universidades atuam, ainda, em parceria com os entes federados federal, estadual e municipal, diretamente em todas as ações desenvolvidas pelo SUS. Com isto, as universidades cumprem o compromisso de formar profissionais de saúde com uma visão social de seu futuro trabalho. A formação dos profissionais de saúde é cada vez mais ampla e precocemente desenvolvida na rede pública de saúde. Temos visto, e isto é altamente desejável, alunos dos primeiros anos de formação em medicina, enfermagem, etc. atuando, sob supervisão docente e preceptores experientes, nas unidades básicas de saúde (UBS). Nestas unidades, o aluno terá contato, dentro do mundo real, com todas as necessidades que nossos cidadãos apresentem.

Terão a possibilidade de forjar sua personalidade profissional dentro de um ambiente que permitirá entender como nossa sociedade está organizada, suas mazelas e suas demandas.

Estar próximo da sociedade é fundamental para a criação de juízo crítico e adequado a nossa realidade. Dentro das universidades se ensina como entender e alcançar os três pilares de nossa profissão de saúde: a arte, principalmente aprendida durante o curso de graduação; o ofício, habilidades adquiridas principalmente durante a residência médica ou multiprofissional e aperfeiçoada ao longo da vida profissional e; a ciência, que deverá acompanhar o profissional durante toda a sua vida. Todo profissional de saúde deve estudar e se aperfeiçoar sempre!

As universidades são entidades de grande estabilidade nas várias sociedades através do mundo e devem ser as mais imunes às influências políticas ou de outras ordens estranhas a sua atuação. Eu costumo dizer que, talvez, apenas a Igreja Católica seja mais estável e perene do que as universidades. Na Europa temos várias universidades do século XIII, isto é, cerca de 300 anos antes do descobrimento do Brasil e que atuam em alto nível até hoje.

As universidades devem ser autônomas, onde os inúmeros pensamentos possam transitar livremente e onde o contraditório seja o grande combustível de sua evolução.

Em minha visão, a maior riqueza na ciência e nas relações humanas está nas interfaces. Quando pensamos diferente mas temos boa-fé e conteúdo nestas diferenças, podemos encontrar soluções mais completas e corretas. Assim deve ser sempre a universidade. Além disto, é impossível imaginar a saúde pública sem os hospitais universitários e de ensino. Os maiores e mais bem avaliados hospitais do País estão qualificados nestes grupos.

Quando olhamos para a realidade de Campinas, como poderíamos imaginar nossa saúde pública sem a Unicamp e a PUC e suas Uuidades de saúde. Sem falarmos de nossos hospitais com atuação no ensino como a Rede Mário Gatti (Mário Gatti e Ouro Verde), a Maternidade de Campinas, a Santa Casa, o Hospital Vera Cruz, a Beneficência Portuguesa, o Centro Infantil Boldrini, o Sobrapar, o Centro Médico, o Samaritano, o Madre Teodora, que oferecem programas de estágios e residências em suas dependências. Certamente, existem outras entidades, aqui não citadas e peço desculpas por isto, que também participam deste esforço de formar profissionais para o SUS e para o sistema complementar de saúde.

Durante a pandemia do SarsCov2, todos os hospitais foram fundamentais ao enfrentamento desta grave crise sanitária e também pelas parcerias que tiveram com o SUS municipal e estadual. Entidades privadas de ensino (universidades e faculdades) também são permanentes parceiras do SUS e desenvolvem seus projetos acadêmicos e pedagógicos, em parte, dentro de instalações públicas de assistência à saúde. São milhares de jovens em formação dentro do cenário do SUS em nossa cidade. É claro que isto aumenta nossa responsabilidade no sentido de oferecer a melhor estrutura, segura e confortável, e a melhor supervisão assistencial possível aos profissionais e consequentemente ao nosso cidadão.

Assim é possível ter o melhor ensino a nossos alunos em seus vários níveis de aprendizagem.

Esta é uma associação virtuosa onde todos ganham, mas principalmente os pacientes e a sociedade que encontram a juventude, a qualidade, a ciência e a humanidade nos atendimentos feitos pela rede SUS. Deste modo, podemos afirmar que o SUS está dentro de praticamente todo sistema educacional da saúde e que as universidades são parte integrante do SUS e fundamentais para a constante qualificação e aperfeiçoamento dos serviços prestados bem como na formação integral de seus alunos.


Carmino Antonio de Souza é professor titular da Unicamp. Foi secretário de saúde do estado de São Paulo na década de 1990 (1993-1994) e da cidade de Campinas entre 2013 e 2020


Fonte: Artigo publicado no site Hora Campinas em 20 de setembro de 2021.




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