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2016 – Domingueira da Saúde 030/2016

 

QUEM BATE? É O FRIO...

 Lenir Santos

 

A partir da data da promulgação da Emenda Constitucional que substituirá a PEC 241, caso não venha a ser alterada em sua segunda votação na Câmara dos Deputados ou pelo Senado Federal, o Brasil será um país que, pelo Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) estará proibido de ter novos nascimentos, envelhecimentos, tecnologias, inovações, devendo congelar-se e permanecer imóvel.

A PEC não visou dar a Cesar o que é de Cesar – um mercado seguro para os investidores nacionais e internacionais – e dar ao povo o que é do povo – seus direitos essenciais de cidadania. Visou apenas dar a Cesar, deixando por volta de 75% da população com os mesmos serviços públicos estagnados ao nível de 2016, como escola, saúde, calçadas, praças, parques, transporte coletivo, esgoto, água tratada, assistência social, segurança pública porque estes estarão congelados nos insuficientes níveis de hoje, uma vez que o Brasil ocupa do 73º lugar em IDH, mesmo sendo a 7ª economia do mundo. Os impostos não estarão congelados, nem as despesas financeiras, somente as primárias, custeadas com os impostos pagos por todos nós. Restará uma população sem o direito a se aquecer.

Um país deve garantir à sua economia segurança jurídica e ajustar as suas contas, não gastando mais do que pode; mas isso deve ser realizado concomitantemente em respeito à segurança jurídica ao exercício da cidadania, dos direitos fundamentais, conforme determina a Carta Constituição que não pode ser suprimida por medidas transitórias.

Se houve erro no tocante ao gasto público, que seja corrigido por todos os modos possíveis: revisão urgente das renúncias fiscais, desperdício da má-gestão, combate à sonegação de impostos, reforma tributária equitativa e progressiva, diminuição dos juros escorchantes; que se tributem as heranças, grandes fortunas e os dividendos das aplicações financeiras; que se ponha fim aos privilégios dos políticos e autoridades públicas, ao compadrio, ao uso e abuso do dinheiro público, sob todas as formas. Que se encarem os descontroles do país para coloca-lo na rota da cidadania das verdadeiras democracias, onde todos possam ser participantes das discussões com severas implicações em suas vidas, como é o caso da PEC 241.

Os serviços de saúde públicos, como exemplo, ainda não estão consolidados, ante o sistemático baixo financiamento, desde 1990, faltando hoje entre 45 a 35% de serviços novos (e recursos); a educação até hoje não conseguiu cumprir suas metas decenais do PNE.

O congelamento de serviços públicos essenciais, no patamar de 2016, corrigido tão somente pela inflação anual, seria admissível se eles fossem suficientes nos dias de hoje e se se considerasse o envelhecimento populacional, o crescimento demográfico, as inovações tecnológicas.  Se fosse admitido vincular o crescimento desses serviços ao das receitas, mesmo sabendo-se que sua base é insuficiente, o dano não seria tão desastroso, conforme se avizinha.

Os recursos da saúde, que teve o ano de 1999 como base de cálculo pela EC 29 atraledo à variação nominal do PIB, já eram considerados insuficientes para o atendimento das necessidades da população, ante as perdas havidas desde a instituição da DRU (1995), que sempre retirou 20% da saúde, além da perda do Plano Real, que foram de  mais ou menos 30% e jamais repostos.

A simulação é matemática fácil: o congelamento refere-se a uma população mal atendida de 202 milhões de pessoas; seremos por volta de 221 milhões pelas projeções em 2016. Assim nesse período, 17 milhões de pessoas não poderão ser atendidas pelo sistema de saúde por congelado ao nível de hoje. O envelhecimento populacional que onera, sobremodo, o sistema de saúde não respeitará o ADCT (que determina que tudo fique congelado) e continuará a crescer, assim como a demografia. As tecnologias inovadoras que podem salvar vidas ou minorar o sofrimento, não poderão ser incorporadas ao sistema que somente crescerá em acordo a inflação oficial que apenas atualiza as perdas do período.  Se houver crescimento das receitas públicas (nossos impostos), que serão destinadas discricionariamente a outros setores, o povo dele não se beneficiará.

Prevê-se que 9% do PIB será livremente gasto pelo governo, que estará livre das obrigações constitucionais vinculadas às receitas. Enquanto as pessoas morrem de frio pelo congelamento, o mercado poderá se aquecer para atender os poucos mais aquinhoados e o povo continuará sem água tratada, esgoto, calçadas, transporte coletivo, saúde, educação, segurança.

Quem decidiu isso – 366 deputados – precisa ter seu nome inscrito nas lápides daqueles que morrerão congelados. Isso sem falar que o descongelamento, em 2036, não permitirá a retomada dos direitos, ante seu nível de defasagem em relação às necessidades e muitos estarão sendo vendidos como mercadoria. Os direitos constitucionais mortos pelo frio de 20 anos (as cláusula pétreas mudaram de sentido para significar congelamento), e o fundamento da República de uma sociedade livre, justa, com menor desigualdade possível, um sonho distante, congelado.

Resta aquele jingle de uma propaganda famosa dos anos 60: “Quem bate? É o frio! Não adianta bater que eu não deixo você entrar...” que se cante isso no Congresso Nacional...

 

 

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ESCLARECIMENTOS AO GOVERNO SOBRE A PEC 241/2016:
O SUS TERÁ RECURSOS REDUZIDOS NOS PRÓXIMOS 20 ANOS!

 

Ronald Ferreira dos Santos[1]
Francisco Funcia[2]

 

Tivemos conhecimento de que o governo está afirmando aos parlamentares e à sociedade em geral que a PEC 241/2016 não reduzirá os recursos federais para a saúde pública. Como não fomos ouvidos até aqui tanto pelo governo, como pelo Sr. Deputado Relator da PEC 241/2016, Darcisio Perondi, outrora defensor do SUS e do fortalecimento do seu financiamento, tentaremos de forma breve alertar e esclarecer o governo que não é verdadeira a afirmação que o “a saúde não perderá recursos com a PEC 241/2016”, tomando como referência os próprios argumentos do governo que nos foram repassados:

1)       São verdadeiras as seguintes afirmações do governo – “não há teto específico para a despesa com saúde” e “nada impede que o Poder Executivo proponha um valor acima do piso” a partir de 2018; porém, não é menos verdade que o governo omite os seguintes dados e informações:

1.1.               O teto de despesas primárias mediante correção dos valores de 2017 pela variação do IPCA representará a deterioração das condições de vida da população, o que significará a deterioração das condições de saúde da população pelo conceito da Organização Mundial de Saúde;

1.2.              Além disso, em 20 anos, para que saúde e educação recebam recursos acima do mínimo, haveria um limite matemático em termos absolutos para redução de despesas de outras áreas que, com recursos congelados nos níveis de 2017, corrigidos somente pela variação do IPCA; com o aumento de receita que ocorrerá nos próximos 20 anos, haverá uma integral transferência desse aumento de receita para pagamento de juros e amortização da dívida em prejuízo da população, cujo crescimento está estimado em torno de 1% ao ano – ou nossos governantes pretendem instituir outra PEC definindo que não pode nascer mais gente do que morrer nos próximos 20 anos?

1.3.              Por fim, analisando a série histórica dos gastos federais com o SUS nos últimos 16 anos, os valores disponibilizados pelas respectivas áreas econômicas de todos os governos sempre ficaram próximas da aplicação mínima constitucional, exceto a partir de 2014, quando a queda de receita inviabilizou a alocação desses valores mínimo, mas não impediu que, em 2014, cerca de R$ 3,8 bilhões de despesas que deveriam ter sido transferidas para os Fundos Estaduais e Municipais de Saúde até 31/12/2014, fossem depositados somente no início de 2015 e onerando orçamento de 2015. Portanto, não é verdade o que o governo afirma – “não há qualquer alteração relativa às despesas de estados e municípios com saúde”: cerca 2/3 das despesas federais em saúde são transferências fundo a fundo para esses entes da Federação, sendo que os estados e, principalmente, municípios aumentaram bastante a alocação de recursos próprios para o financiamento do SUS, não tendo mais margem de ampliação para compensar a queda que ocorrerá nessas transferências após a PEC 241/2016.

2)       Quando o governo afirma que “a PEC aumenta o gasto mínimo (piso) em saúde, para 2017, em aproximadamente R$ 10 bilhões”, de R$ 104,0 bilhões que seria pela EC 86/2015 para R$ 114,0 bilhões[3] com a PEC 241/2016, e que a partir de 2018 esse “aumento” seria corrigido pela variação anual do IPCA, além das nossas questões tratadas no item anterior, o governo está omitindo que:

2.1.              O ponto de partida dessa projeção está completamente arrochado pela queda de receita observada a partir de 2014, como o próprio gráfico apresentado pelo governo demonstra, além das perdas trazidas pela vigência EC 86/2015 em 2016 em relação à regra que vigorava pela EC 29/2000, tema que foi denunciado pelo Conselho Nacional de Saúde em 2015 antes da aprovação da mudança pelos senhores congressistas;

2.2.            Os cenários de perdas para o SUS em 2017, dependendo da base de comparação:

·         PERDA DE R$ 5,5 bilhões: considerando que as despesas “competência total” de 2014 (empenhadas em 2014 e empenhadas no início de 2015) corrigidas para 2017 seriam de R$ 119,2 bilhões;

·         PERDA DE R$ 1,0 bilhão: considerando a regra aprovada no Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2017, ou seja, o valor empenhado em 2016 corrigido pela variação do IPCA, que foi definido pelo Ministro Meirelles em entrevista no dia 04 de outubro em 7,2%; considerando que serão empenhados em ASPS pelo Ministério da Saúde em 2016 os R$ 106,9 bilhões que foram disponibilizados no Decreto 8784, o valor de 2017 não poderia ser inferior a R$ 114,6 bilhões; e

·         PERDA DE R$ 5,0 bilhões: considerando que as despesas empenhadas em 2015 corrigidas para 2017 seriam de R$ 118,7 bilhões

2.3.             O substitutivo da PEC 241/2016 apresentado pelo Sr. Deputado Relator, Darcisio Perondi, representa uma "cortina de fumaça" para encobrir também a grande perda bilionária acumulada em 20 anos para o SUS:

·         PERDA DE R$ 135 bilhões: considerando o cenário retrospectivo, que considera a vigência da PEC 241/2016 no período 2003-2015, portanto, em comparação aos valores efetivamente empenhados nesse período, não teriam sido aplicados no SUS o valor R$ 135 bilhões a preços médios de 2015 (isto é, a perda é muito maior que um ano inteiro empenhado em 2015 e que deverá ser empenhado em 2016; a aplicação efetiva desse período anterior ficou  “congelada” em torno de 1,7% do PIB e, se vigorasse a PEC 241/2016, teria sido reduzida para cerca de 1,1% do PIB no final desse período.

·         PERDA DE R$ 434 bilhões: considerando o cenário prospectivo apresentado na nota conjunta do CONASS e CONASEMS de 05/10/2016, que projeta essa perda no período 2017-2036;

3)      Tivemos conhecimento também que o governo questionou o cenário de projeção, baseado em crescimento econômico modesto do PIB e aumento modesto da receita corrente líquida em termos nominais, além da variação anual do IPCA em torno da meta de 4,5%. Esse questionamento nos preocupa porque o governo está admitindo implicitamente que:

3.1    A inflação não cairá e chegará ao centro da meta nos próximos 20 anos – mas não é isto que o governo diz que ocorrerá com a PEC 241?

3.2   A recessão será mantida por 20 anos: afinal, a receita corrente líquida nominal cresce bem mais que a variação da inflação quando o país cresce, o que pode ser comprovado na série histórica dos últimos 16 anos, exceto a partir de 2014, quando o país entrou em recessão. Mas, o argumento governamental não é exatamente o oposto, que a PEC promoverá o crescimento econômico?

3.3   Se houver o crescimento econômico, o congelamento de despesas primárias representará, sim, a redução de despesas com o SUS, em média, 30% ao ano, decrescendo a participação em relação ao PIB de 1,7% para menos de 1,0%, em troca do crescimento das despesas com juros e amortização da dívida. Por isso, a PEC 241/2016 está sendo chamada de “PEC da morte”!

4)     Para o governo, o principal problema fiscal do Brasil é a vinculação constitucional, que garante a aplicação mínima para a saúde e educação: além de não ser verdade, representa uma ameaça ao bem-estar das famílias e dos trabalhadores, para priorizar o pagamento de juros e amortização da dívida pública.

5)     Há alternativas de modo a preservar o interesse da maioria dos duzentos e oito milhões de brasileiros – que teriam seus direitos suprimidos com a aprovação da PEC 241/2016. Por exemplo: rever a renúncia fiscal (gastos tributários), que está projetada acima de R$ 300 bilhões para os próximos anos; rever a legislação do IR, para criar faixas de rendimentos superiores às atuais com alíquotas mais elevadas (de modo a tributar os que estão no topo da pirâmide social); rever a estrutura tributária, para que se reduza a incidência sobre produção e consumo e aumente a incidência sobre patrimônio, renda e riqueza; rever a isenção da tributação das remessas de lucros e dividendos, criar uma tributação sobre as grandes transações financeiras e sobre as grandes fortunas, bem como aumentar a tributação sobre tabaco, álcool, motocicletas entre outras iniciativas possíveis. Da mesma forma, o CNS defende que, conjuntamente, sejam adotadas medidas para aumentar a qualidade do gasto público em geral, e da saúde em particular, com a adoção de mecanismos de gestão mais eficientes que, em última instância, requerem recursos para a modernização tecnológica para esse fim de modo a dar conta de um país com dimensão continental e fortes desigualdades regionais. No caso do SUS, é preciso também garantir que os recursos adicionais sejam destinados para a mudança do modelo de atenção, para que a atenção primária seja a ordenadora do cuidado, e para a valorização dos servidores públicos da saúde, que refletirão na qualidade do atendimento às necessidades de saúde da população.

6)     Desta forma, o CNS entende que a PEC 241/2016, se aprovada, aprofundará a atual política econômica recessiva, gerando desemprego, queda de renda e sucateamento das políticas sociais. Portanto defendemos uma mudança da orientação desta política para a promoção do crescimento e da inclusão social, reforçando o papel dos gastos públicos em saúde para impulsionar o desenvolvimento e para reduzir as desigualdades sociais e regionais.

ü  NÃO À RECESSÃO E AO DESEMPREGO!

ü  NÃO À PEC 241/2016 QUE LEVARÁ AO DESMONTE DO SUS E À REDUÇÃO DE DIREITOS SOCIAIS!

ü  O CNS DEFENDE UMA NOVA POLÍTICA ECONÔMICA E UMA OUTRA FORMA DE SOLUÇÃO DAS CONTAS PÚBLICAS QUE RESPEITE A CONSTITUIÇÃO-CIDADÃ!

 

[1] Farmacêutico e Presidente do Conselho Nacional de Saúde

[2] Economista e Mestre em Economia Política (PUC-SP), professor e consultor do Conselho Nacional de Saúde

[3] O valor sem arredondamento é R$ 113,7 bilhões (15% da Receita Corrente Líquida estimada no PLOA 2017 em R$ 758,3 bilhões), adotado para o cálculo das perdas no subitem 2.2

 

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  Domingueira da Saúde - 030/2016 - 16/10/2016

 

ANEXO

1 - Nota técnica sobre a PEC 241

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


 



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