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2017 – Domingueira da Saúde 020/2017

 

 

GASTO COM SAÚDE MUNICIPAL DE ABRANGÊNCIA REGIONAL:

QUEM PAGA A CONTA?

 

Lenir Santos

 

O SUS é um sistema de saúde integrado e regionalizado em termos constitucionais (art. 198). As regiões de saúde são recortes territoriais nos quais se agrupam municípios limítrofes, delimitados por identidades, que se servem de serviços comuns que, sob a coordenação do Estado em articulação com os municípios, compõem redes de atenção à saúde. O Decreto nº 7.508, de 2011, dispõe ser necessária a existência mínima de serviços de atenção básica, urgência e emergência, atenção psicossocial, atenção ambulatorial especializada e hospitalar e vigilância em saúde (art. 5º) para conformação de uma região de saúde.

Os serviços de saúde regionais serão a base para as transferências de recursos entre os entes federativos, conforme estatui o referido Decreto, art. 6º, determinando a Lei Complementar nº 141, de 2012, em seu art. 30, que a equidade federativa regional advém do planejamento e das metas regionais.

Esse é um relevante tema para a distribuição equitativa de recursos da saúde, vez que o gasto regional a cargo de um município, deve ser discriminado em local e regional para delimitar as fontes que os financiam por serem de âmbito municipal, estadual e federal. Releva dizer que despesas municipais de cunho regional, devem ser suportadas pelas transferências estaduais e federais, cabendo ao município aplicar recursos de suas receitas próprias somente em serviços de interesse local. O município necessita, para cumprir seu dever constitucional de cuidar da saúde da população, contar com o apoio técnico e financeiro da União e do Estado (art. 30, VII, CF). Seu dever substantivo deve se somar ao dever dos demais entes federativos quanto as garantias financeiras para a sua sustentabilidade.

Essa garantia financeira interfederativa tem dicção na Lei nº 8.142, de 1990, na EC 29, de 2000 e na Lei Complementar 141, de 2012 que define, em seu art. 17 e 19, os critérios de rateio dos recursos da União[1] para os demais entes federativos.

Como a arquitetura organizativa do SUS está fundada na integração federativa de serviços que por sua vez irão compor as redes interfederativas de serviços, insertas nas regiões de saúde[2] ou inter-regionais, consequentemente o planejamento deve ter caráter regional, definindo os serviços de abrangência regional e os entes responsáveis, na região, pelo atendimento de munícipes de diversos municípios, bem como o financiamento que há de ser tripartite. Esse o motivo de o Decreto nº 7.508, de 2011, instituir o contrato organizativo de ação pública da saúde (COAP), o qual dá garantia jurídica às avenças regionais. O contrato estabelece em suas cláusulas as responsabilidades dos entes na região, sejam as dos municípios, as do Estado e da União, devendo definir os recursos que irão dar sustentabilidade aos serviços municipais de cunho regional.

Por isso, o planejamento regional deve considerar os custos regionais de competência municipal, de forma apartada de seus custos locais para fixação da despesa que extrapola o interesse local municipal e que possivelmente possam estar onerando recursos de receitas próprias do município. Essa definição permitirá antever as responsabilidades financeiras dos entes estadual e federal na região de saúde.

Em paralelo às despesas havidas com os serviços destinados à população oriunda de outros municípios na região de saúde ou entre regiões, deve ainda ser calculado o correspondente gasto com pessoal por ele onerar o município e impactar o limite definido pela Lei Complementar 101, de 2000 (LRF), art. 19.

Esse impacto deve ser compartilhado com todos os entes da região, ou interregião, sob pena de gerar iniquidade federativa por impor deveres a ente municipal que extrapolam suas obrigações próprias. Os custos dos serviços municipais de referência regional devem ser arcados pelo Estado e pela União, bem como as específicas com pessoal da área da saúde que extrapolam a abrangência local (estritamente municipal), devem ser rateados entre os municípios da região[3], na falta de outra solução legislativa[4].

Considere-se, ainda, as despesas que podem advir de ações judiciais ou de pedidos de cunho administrativo decorrentes da responsabilidade civil objetiva do ente federativo referência regional, quando elas disserem respeito a atendimento de paciente de outro município. É obrigatório haver uma forma de compensação do ente municipal-polo na região de saúde pelas despesas havidas com munícipe de outro ente federativo. Não nos esquecemos, ainda, dos custos operacionais com a gestão de serviços municipais de cunho regional, pelos ônus para além da questão financeira, ínsitos à gestão de serviços, como o tempo dispendido pelo secretário de saúde, as responsabilidades com as demandas político-administrativas, o maior número de cargos públicos a impactar futuramente o sistema previdenciário municipal e assim por diante.

A região de saúde deve prever todas as formas possíveis de compensação de recursos do ente municipal com responsabilidades regionais; isso se insere no âmbito da governança regional ainda incipiente na regionalização da saúde.

De imediato advoga-se a relevância de um provimento legislativo que disponha sobre diretrizes gerais da região de saúde, sua governança, forma de compensação dos custos para os municípios-polos e, ainda, a possibilidade de se instituir pessoa jurídica associativa que atenda as especificidades do SUS, conforme previsto no Projeto de Lei nº 1.645, de 2015, que tramita na Câmara Federal[5]. Essa pessoa jurídica se responsabilizaria pela gestão de serviços de abrangência regional e o COAP definiria as obrigações de cada um na região, desonerando o município-polo e permitindo melhor governança regional e superação de impasses como os aqui previstos.

Quanto à questão do limite de gasto com pessoal, é medida urgente que pode desde logo ser adotada para diminuir os impactos a onerar tão-somente o ente municipal de abrangência regional no SUS, que atua de modo solidário, cooperativo sem respaldo quanto às necessárias compensações de seus deveres sanitários regionais.

Não seria sem fundamento propor que os tribunais de contas dos Estados discutam a hipótese de provimentos permitindo a divisão do encargo com pessoal com os municípios da região. Para tanto é necessário que esses dados estejam à disposição, podendo o Conasems e Cosems pautarem esse tema entre seus pares para alcançarem essas estimativas do gasto com pessoal para atendimento de demanda regional, bem como as despesas gerais com os serviços que extrapolam os limites demográficos do município-referência, a fim de identificar quais recursos os sustentam, os das transferências estadual e federal ou os das receitas próprias municipais.

 


[1] As transferências da União para Estados e Municípios devem observar três eixos, a) as necessidades de saúde da população sob a dimensão socioeconômica, demográfica, espacial e epidemiológica; b) a organização da rede de serviços; c) a avaliação de desempenho dos entes.

[2] Importante situar que as regiões de saúde são despersonalizadas, sendo recortes territoriais sem personalidade jurídica.

[3] Ou se partilhar o gasto com pessoal que onera apenas o município-referência ou se altera a LRF para cumprir a Constituição de que as despesas municipais devem ser tão-somente aquelas que atendam o interesse local municipal no âmbito de suas competências constitucionais.

[4] Os serviços de saúde de referência regional devem ser considerados como se fora um sistema condominial, não podendo ser arcado apenas pelo ente que o detém, mas sim pelos entes estadual e federal. Tudo o que é interfederativo não pode estar sob a responsabilidade exclusiva de um único ente municipal.

[5] Há também um projeto de lei estadual, SP, n. 120, do deputado estadual Carlos Neder que dispõe sobre regras gerais sobre região de saúde no Estado de SP.

 

  Domingueira da Saúde – 020 2017 – 24 09 2017



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