Apresentação

A Revista Domingueira da Saúde é uma publicação semanal do Instituto de Direito Sanitário - IDISA em homenagem ao Gilson Carvalho, o idealizador e editor durante mais de 15 anos da Domingueira da Saúde na qual encaminhava a mais de 10 mil pessoas informações e comentários a respeito do Sistema Único de Saúde e em especial de seu funcionamento e financiamento. Com a sua morte, o IDISA, do qual ele foi fundador e se manteve filiado durante toda a sua existência, com intensa participação, passou a cuidar da Domingueira hoje com mais de 15 mil leitores e agora passa a ter o formato de uma Revista virtual. A Revista Domingueira continuará o propósito inicial de Gilson Carvalho de manter todos informados a respeito do funcionamento e financiamento e outros temas da saúde pública brasileira.

Editores Chefes
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Conselho Editorial
Élida Graziane Pinto
Nelson Rodrigues dos Santos
Thiago Lopes Cardoso campos
Valéria Alpino Bigonha Salgado

ISSN 2525-8583



Domingueira nº 30 - Setembro 2025

Índice

  1. Vigilância Sanitária e Contratualização no SUS: a regulação invisível da saúde pública - por Fabiano dos Anjos Pereira Martins e Márcia Cristina Olivé Roseno

Vigilância Sanitária e Contratualização no SUS: a regulação invisível da saúde pública

Por Fabiano dos Anjos Pereira Martins e Márcia Cristina Olivé Roseno


Introdução

Com frequência, os jornais noticiam a abertura de novos leitos, a construção de hospitais, a inauguração de Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) e Centros Especializados, ou ainda a formalização de parcerias público-privadas e contratações emergenciais. Contudo, pouco se evidencia sobre o esforço institucional, o tempo demandado e o trabalho multiprofissional que antecedem essas entregas.

Nesse cenário, a Vigilância Sanitária (VISA), muitas vezes invisível aos olhos da sociedade, assume papel estratégico na contratualização e na regulação de serviços de saúde, sendo fundamental para assegurar que os serviços pactuados estejam em conformidade com padrões técnicos, legais e sanitários.

Contratualização no SUS: conceito e finalidade

A contratualização de serviços de saúde é um neologismo cunhado no Sistema Único de Saúde (SUS) que designa acordos formais entre gestores e prestadores — públicos ou privados — com vistas a alinhar a prestação de serviços às políticas públicas de saúde. Mais do que viabilizar repasses financeiros, a contratualização estabelece responsabilidades, metas, critérios de qualidade e mecanismos de monitoramento, tornando-se um eixo estruturante da Regulação da Atenção à Saúde (CONASS, 2022). Nesse processo, a Vigilância Sanitária é ator central ao garantir que os serviços prestados atendam aos padrões de qualidade e segurança exigidos pela legislação.

Vigilância Sanitária como órgão regulador

A Lei nº 8.080/1990 atribui à VISA o controle de bens e serviços que impactam a saúde da população. Tal competência se materializa pelo poder de polícia administrativa, instrumento que confere à Administração Pública a prerrogativa de limitar o exercício de atividades privadas em prol do interesse coletivo (MEIRELLES, 2012).
Assim, a VISA assegura que serviços de saúde, diagnósticos e terapêuticos, bem como produtos e tecnologias, sejam ofertados em conformidade com normas sanitárias, protegendo a saúde coletiva.

Atuação prática da Vigilância Sanitária

A contribuição da VISA para a contratualização e fiscalização vai além da inspeção hospitalar. Entre os principais eixos de atuação destacam-se:
1. Serviços de saúde – fiscalização de centros cirúrgicos, UTIs, laboratórios, serviços de imagem, nutrição hospitalar, esterilização e controle de infecções.
2. Projetos arquitetônicos – análise e aprovação de obras e reformas em unidades de saúde, assegurando conformidade com normas da ANVISA, ABNT e legislações locais.
3. Serviços de interesse à saúde – regulação de farmácias, laboratórios, clínicas odontológicas, serviços de alimentação, funerárias, academias, clínicas veterinárias, empresas de controle de pragas, produção de água envasada e gelo, cosméticos e saneantes.
4. Avaliação de tecnologias em saúde – verificação de segurança e qualidade de medicamentos, vacinas, hemoderivados, equipamentos e softwares médicos, etapa essencial para credenciamento e aquisição de insumos.
5. Segurança do paciente e qualidade assistencial – incorporação de parâmetros sanitários nas metas contratuais, incluindo protocolos de higienização, controle de infecções e gestão de resíduos.
6. Fiscalização de modelos de gestão – monitoramento técnico-sanitário em contratos com Organizações Sociais de Saúde (OSs) e parcerias público-privadas, fortalecendo a accountability.
7. Inovação digital – uso de sistemas eletrônicos de licenciamento, inteligência de dados e monitoramento remoto para ampliar transparência e rastreabilidade.

Papel estratégico na contratualização

Ao garantir a conformidade técnica e sanitária dos prestadores contratados, a Vigilância Sanitária transforma a contratualização em mais que um instrumento burocrático: em um mecanismo de proteção da saúde coletiva.
Essa inserção é essencial para a sustentabilidade do SUS, pois articula a regulação sanitária com a gestão contratual, fortalece a confiança da sociedade nas instituições e assegura qualidade e segurança nos serviços financiados com recursos públicos.

Conclusão

A contratualização no SUS não deve ser vista apenas como ato administrativo, mas como estratégia de gestão, regulação e garantia de direitos. Nesse processo, a Vigilância Sanitária figura como pilar essencial, exercendo funções que vão desde a análise de projetos e fiscalização hospitalar até a avaliação de tecnologias, o controle de serviços de interesse à saúde e a auditoria de contratos complexos.
Com a incorporação da inovação digital e a articulação interfederativa, a VISA fortalece a contratualização como instrumento moderno e imprescindível para a efetividade, a qualidade e a sustentabilidade do Sistema Único de Saúde.

Referências
ABNT – ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 9050: acessibilidade a edificações, mobiliário, espaços e equipamentos urbanos. Rio de Janeiro, 2015.
ANVISA – AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA. Resolução RDC nº 50, de 21 de fevereiro de 2002. Dispõe sobre o regulamento técnico para planejamento, programação, elaboração e avaliação de projetos físicos de estabelecimentos assistenciais de saúde. Diário Oficial da União, Brasília, 20 fev. 2002.
ANVISA – AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA. Resolução RDC nº 63, de 25 de novembro de 2011. Dispõe sobre os requisitos de boas práticas de funcionamento para os serviços de saúde. Diário Oficial da União, Brasília, 28 nov. 2011.
BRASIL. Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 20 set. 1990.
CONASS – CONSELHO NACIONAL DE SECRETÁRIOS DE SAÚDE. Orientações para contratualização. Brasília: CONASS, 2022. Disponível em: https://www.conass.org.br/guiainformacao/orientacoes-para-contratualizacao/. Acesso em: 22 abr. 2025.
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 38. ed. São Paulo: Malheiros, 2012.
VECINA NETO, Gonzalo; MARQUES, Maria Cristina da Costa; FIGUEIREDO, Ana Maria. Vigilância sanitária no Brasil. In: GIOVANELLA, Lígia et al. (org.). Tratado de saúde coletiva. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2009.


Fabiano dos Anjos Pereira Martins é Enfermeiro, Mestre em Saúde Coletiva pela UnB e Especialista em diversas áreas da Saúde Pública (Fiocruz, UFSJ, IFB). Atuou como gestor em diferentes níveis do SUS e atualmente é Subsecretário de Vigilância à Saúde do Distrito Federal, com experiência consolidada em Vigilância à Saúde, regulação sanitária, emergências em saúde pública e inovação em políticas públicas.

Márcia Cristina Olivé Roseno _é Bióloga, Diretora de Vigilância Sanitária, auditora de atividades urbanas da Subsecretaria de Vigilância à Saúde, da Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal. _




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