Apresentação

A Revista Domingueira da Saúde é uma publicação semanal do Instituto de Direito Sanitário - IDISA em homenagem ao Gilson Carvalho, o idealizador e editor durante mais de 15 anos da Domingueira da Saúde na qual encaminhava a mais de 10 mil pessoas informações e comentários a respeito do Sistema Único de Saúde e em especial de seu funcionamento e financiamento. Com a sua morte, o IDISA, do qual ele foi fundador e se manteve filiado durante toda a sua existência, com intensa participação, passou a cuidar da Domingueira hoje com mais de 15 mil leitores e agora passa a ter o formato de uma Revista virtual. A Revista Domingueira continuará o propósito inicial de Gilson Carvalho de manter todos informados a respeito do funcionamento e financiamento e outros temas da saúde pública brasileira.

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Conselho Editorial
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Valéria Alpino Bigonha Salgado

ISSN 2525-8583



DOMINGUEIRA nº 43 - Dezembo 2024

Judicialização de medicamentos e o novo ônus da prova

Por Clenio Jair Schulze


As súmulas vinculantes 60 e 61 do Supremo Tribunal Federal trouxeram uma revolução na judicialização da saúde no Brasil.

E um dos temas abordados pelo STF trata do ônus da prova nos processos sobre medicamentos não incorporados no SUS.

Na súmula vinculante 60 – Tema 1234 – a Corte Suprema fixou o seguinte:

“4.3) Tratando-se de medicamento não incorporado, é do autor da ação o ônus de demonstrar, com fundamento na Medicina Baseada em Evidências, a segurança e a eficácia do fármaco, bem como a inexistência de substituto terapêutico incorporado pelo SUS.” (1)

Já na súmula vinculante 61 – Tema 6 – o conteúdo é este:

“2. É possível, excepcionalmente, a concessão judicial de medicamento registrado na ANVISA, mas não incorporado às listas de dispensação do Sistema Único de Saúde, desde que preenchidos, cumulativamente, os seguintes requisitos, cujo ônus probatório incumbe ao autor da ação:

(a) negativa de fornecimento do medicamento na via administrativa, nos termos do item “4” do Tema 1.234 da repercussão geral;

(b) ilegalidade do ato de não incorporação do medicamento pela Conitec, ausência de pedido de incorporação ou da mora na sua apreciação, tendo em vista os prazos e critérios previstos nos artigos 19-Q e 19-R da Lei nº 8.080/1990 e no Decreto nº 7.646/2011;

(c) impossibilidade de substituição por outro medicamento constante das listas do SUS e dos protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas;

(d) comprovação, à luz da medicina baseada em evidências, da eficácia, acurácia, efetividade e segurança do fármaco, necessariamente respaldadas por evidências científicas de alto nível, ou seja, unicamente ensaios clínicos randomizados e revisão sistemática ou meta-análise;

(e) imprescindibilidade clínica do tratamento, comprovada mediante laudo médico fundamentado, descrevendo inclusive qual o tratamento já realizado; e

(f) incapacidade financeira de arcar com o custeio do medicamento.”(2)

Algumas reflexões sobre o novo cenário:

1) as petições iniciais deverão se ajustar às novas exigências;

2) em caso de não comprovação dos itens acima mencionados na petição inicial o Judiciário não poderá conceder a tutela de urgência;

3) os itens mencionados são de observância obrigatória, sob pena de nulidade da decisão judicial que desconsiderar os requisitos;

4) necessidade de análise do conteúdo da posição seguida pela Conitec – no caso de haver sua manifestação pela não incorporação do medicamento – ou análise dos itens que devem ser considerados para incorporação (evidências científicas e avaliação econômica) – na hipótese de ausência de manifestação da Conitec;

5) necessidade de indicação de altos níveis de evidência científica, descartando-se os baixos níveis de evidência;

6) demonstração da indispensabilidade do medicamento (necessidade = não comodidade ou conforto);

7) apresentação de provas sobre a hipossuficiência financeira (comprovantes de renda ou declaração de imposto de renda).

Alguns itens mencionados nas súmulas vinculantes já estavam previstos na jurisprudência anterior (Tema 106 do STJ, por exemplo). Contudo, a diferença é que agora tais requisitos estão previstos em súmulas vinculantes e a sua não observância ensejará a nulidade da decisão judicial.


Notas e referências:

1) BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RECURSO EXTRAORDINÁRIO 1.366.243 SANTA CATARINA. Relator MIN. GILMAR MENDES. Disponível em: https://portal.stf.jus.br/processos/downloadPeca.asp?id=15370982407&ext=.pdf. Acesso em: 18 Nov. 2024.

2) BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário 566471. Relator MIN. LUÍS ROBERTO BARROSO. Disponível em: https://portal.stf.jus.br/jurisprudenciaRepercussao/verAndamentoProcesso.asp?incidente=2565078&numeroProcesso=566471&classeProcesso=RE&numeroTema=6. Acesso em: 18 Nov. 2024.


Publicado no Empório do Direito

Clenio Jair Schulze é Doutor e Mestre em Ciência Jurídica (Univali). Pós Graduado em Justiça Constitucional pela Universidade de Pisa na Itália. Professor da Escola da Magistratura Federal de Santa Catarina – ESMAFESC. Juiz federal. Autor dos livros “Judicialização da Saúde no Século XXI” (2018) e “Direito à Saúde" (2019, 2ed.).




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