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Entrevista com Jairo Bisol: "Não há dinheiro que pague um modelo de um Estado comprador de serviços"

16/08/2013
 
Republicado no blog da Frente Nacional contra a Privatização da Saúde em 20/08/2013
 
O promotor de Justiça Jairo Bisol foi um dos expositores do 6º Congresso do SindSaúde-GO, o 6º ConSindSaúde. Na análise de conjuntura sobre a garantia do direito à Saúde e as relações de trabalho, ele destacou a importância da definição do modelo de gestão do Sistema Único de Saúde (SUS) para garantir prioritariamente seu financiamento e o acesso da população à Saúde.
 
Sindsaúde – Que notícias o senhor traz ao trabalhador e trabalhadora nessa análise de conjuntura?
 
Jairo Bisol - A gente não traz boa notícia sobre o SUS. É um grande desafio implantar uma política com a extensão e a profundidade do SUS na atualidade, por que é uma política de inclusão social. Foi uma vitória da sociedade brasileira a consagração dessa política na Constituição, mas infelizmente, apesar de ser uma política de Estado e vinculante das políticas de governo, os governos que sucederam após a Constituinte não assumiram efetivar o SUS. Então, o que se tem é um abismo muito grande entre o SUS legal, constitucional, e isso que se chama "SUS real", que em grande parte é uma ausência de SUS.
 
Sindsaúde – Quais os principais pontos que contribuem para essa “ausência de SUS”?
 
Jairo Bisol – A gente tem visto e acompanhado decisões importantes no plano político que são desestruturantes e inviabilizadoras da política por vários motivos. O governo não assume a política porque não define o modelo de gestão. Como fazer uma política de Saúde Universal e Integral sem definir um modelo de gestão para que as ações e os modelos de Saúde sejam produzidas pelo Estado? - pois esta é sua responsabilidade constitucionalmente definida. Não há um modelo de gestão, não parece haver vontade política do governo em definir um modelo de gestão, não há um financiamento adequado. Então o subfinanciamento e ausência de um modelo de gestão comprometem totalmente a efetivação. Não há controles, o sistema de controle não foi implantado, o Sistema Nacional de Auditoria não foi implantado, o DENASUS, que é o Departamento Nacional de Auditoria do SUS, está morrendo à míngua por aposentadoria de seus membros. Então o pouco dinheiro que se tem do subfinanciamento, a total ausência de gestão e os governos trilhando pelo caminho da compra de serviços da iniciativa privada, estão conduzindo o SUS à sua inviabilidade, à sua morte.
 
Sindsaúde – Qual seria a alternativa para evitar essa “morte do SUS”?
 
Jairo Bisol – Eu acho que é muito importante fazer a defesa dessa política e cobrar muito seriamente dos governos, porque se trata de uma política de Estado e os governos não têm a discricionariedade de não aplicá-la. De certa forma a não efetivação do SUS mostra que o Estado democrático de direito no Brasil ainda está dando seus primeiros passos. Por que é uma não efetivação do próprio Estado.
 
Sindsaúde – O problema então é a falta de interesse da gestão em fazer com que o SUS se consolide segundo seus princípios?
 
Jairo Bisol – O SUS é uma política que de certa forma anda na contramão das definições da área econômica em todos os governos que tivemos após a sua implantação. É notória a posição da área econômica desses governos em relação a uma postura neoliberal, desestatizante, privatizadora, ampliando os espaços de ocupação da iniciativa privada em campos que seriam do Estado. Na Saúde é a mesma coisa. Então, um SUS que compra serviços da iniciativa privada é inviável porque não há dinheiro que pague uma política universal - todos têm direito – e integral – o direito a todas as ações e serviços que são necessários para manter a sua Saúde e para recuperar em caso de doença. Não há como você viabilizar isso aí. Não há dinheiro que pague um modelo de um Estado comprador de serviços. Então o Estado tem que produzir os serviços de uma forma econômica e precisa definir o modelo de gestão que viabilize. E não há vontade política de definir.
 
Sindsaúde – O senhor acredita que esse o caminho de terceirização da Saúde está fadado ao fracasso?
 
Jairo Bisol – Espero que esteja fadado ao fracasso o caminho que os governos atuais estão tomando. Por que as ruas estão aí, a manifestação popular é muito grande, dificilmente vai se conseguir revogar essa política universal e integral de Saúde. Agora, realmente essa privatização também está ligada ao modelo político brasileiro. Por quê? Por que a gente pensa a corrupção como uma disfunção do modelo político. Infelizmente, se bem observada a cena, a corrupção, os desvios dos recursos orçamentários, é uma conduta absolutamente estruturante das práticas políticas no Brasil. Essa que é a vergonhosa verdade da pátria. E, certamente, para você desviar recursos da Saúde, é muito mais fácil por um processo de privatização, porque você desvia “x” por cento de um mega-contrato do que você ficar desviando "a granel" dentro do modelo público de gestão.
 
Sindsaúde – Como combater essa política de terceirização?
 
Jairo Bisol – Acho que a efetivação de uma política dessa complexidade e desse alcance, com essa força de inclusão social, pressupõe uma reforma do Estado. Não só uma reforma política pra que se acabe com o fenômeno da corrupção, dos desvios dos recursos públicos, e se possa efetivar políticas como a de Saúde, mas também uma reforma do Judiciário. O poder judicante no país está concentrado nas cortes recursais e esta política inefetiva, que deveria ser objeto de jurisdição constitucional – a garantia de sua efetivação, sua obrigatoriedade de efetivação pelos governos – não se dá porque o Judiciário não intervém, e sim porque as cortes recursais são nomeadas pelos próprios governos.
 
*Retirado do SindSaúde-GO
**Republicado no blog da Frente Nacional contra a Privatização da Saúde em 20/08/2013
 
Fonte: blog da Frente Nacional contra a Privatização da Saúde


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