Endereço: Rua José Antônio Marinho, 450
Barão Geraldo - Campinas, São Paulo - Brasil
Cep: 13084-783
Fone: +55 19 3289-5751
Email: idisa@idisa.org.br
Adicionar aos Favoritos | Indique esta Página

Entrar agora no IDISA online

Saúde não tem preço

Lenir Santos[1]
Vivemos em uma era em que quase tudo é precificado, a partir do nosso tempo, que na era da velocidade não pode ser desperdiçado por traduzir-se, de algum modo, em competição e por competição significar melhoria de renda, e renda significar poder de consumo.
Parece que na sociedade contemporânea há um ‘certo’ abandono, pelo cidadão, de suas lutas pelos direitos sociais e uma busca por maior renda para consumi-los no mercado. Uma sociedade que vai, forçosamente, em busca do consumo, mediante pagamento, dos direitos à educação, saúde, previdência, segurança por se sentir cansada ou isolada em suas lutas pelos direitos de cidadania.
Esta é uma era em que a própria soberania do Estado parece colocada à prova ante um mundo financista, de fortes blocos econômicos mundiais. Uma época que parece de indefinição; era do pós-tudo: pós-moderno, pós-muro de Berlim; pós-história, mas é nesta mesma era que estamos a discutir o direito à saúde para 190 milhões de brasileiros.
Sabemos que o direito à saúde demorou muito para ser reconhecido em nosso país, mas entre a demora e o reconhecimento, a abundância da inclusão de 190 milhões de pessoas num sistema de acesso universal e igualitário. Essa utopia, certamente, já foi conquistada. Temos, agora, à nossa frente, a utopia da real efetividade desse direito. Sem dúvida não é coisa fácil. Pelo contrário. Dificuldades sem fim num mundo que já discute questões de bioética, de clonagem, de barriga de aluguel, engenharia genética, de infindos problemas biotecnológicos que batem e adentram a porta do século XXI enquanto doenças endêmicas continuam a causar profundo sofrimento humano.
Ao lado de temas de tão avançada ciência e tecnologia, nos deparamos com realidades que nos levam a profundas reflexões, como a falta de atendimento médico em determinadas regiões; a dificuldade de municípios em fixar médicos em áreas remotas; a dificuldade ao acesso a medicamentos e leitos hospitalares. Essas contradições do pós-moderno convivendo com tão antigas mazelas, nos deixam cheios de perplexidades ante uma sociedade que se moderniza à velocidade da luz sem resolver problemas seculares das  desigualdades sociais e  da pobreza humana.
Na saúde, certamente, é preciso racionalidade e utopia. Utopia porque sem ela não incluiremos todos os cidadãos brasileiros no sistema público de saúde. Racionalidade na escolha dos problemas sanitários os quais devem ser enfrentados obstinadamente, porque sem centralidade racional dificilmente os venceremos, tão inúmeros são.
Dentre as medidas sanitárias que devem ser priorizadas, como a melhoria do acesso do cidadão aos serviços de saúde, fortalecimento da atenção primária, humanismo na assistência ao cidadão, melhoria da gestão do sistema público – uma delas deve ser a garantia de medicamentos, fonte de intensa judicialização.
É preciso ter em mente que nessa sociedade de velocidade, saúde continua a ocupar o lugar de sempre: o da fragilidade humana ante um diagnóstico; o da angústia da espera; o da perplexidade e a insegurança diante da doença. A tecnologia não mudou as necessidades humanas mais intrínsecas, como a de querer ser ouvido, ser consolado, ser amparado. Tanto que podemos dizer que vivemos na era do pós-tudo, exceto da pós-necessidade humana de querer ser considerado, ser ouvido, ser levado em conta. É dever do Poder Público continuar à frente de sua indelegável responsabilidade de prover políticas públicas que garantam os direitos fundamentais do ser humano, dentre eles o direito à saúde.
Interessante pensar que ao lado do tão falado fim das utopias, de uma sociedade mundial que mais protege o capital que o emprego, que mais incentiva a competitividade do que a qualidade de vida, ainda assim não abandonamos a utopia da melhoria dos serviços de saúde, da garantia do acesso a um serviço público de maior qualidade e humanismo. Para nós, saúde não tem preço.
[1]Coordenadora do Instituto de Direito Sanitário Aplicado – IDISA; Coordenadora do Curso de Especialização em Direito Sanitário da UNICAMP-IDISA; ex-procuradora da UNICAMP.


Meus Dados

Dados do Amigo

Copyright © . IDISA . Desenvolvido por W2F Publicidade