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Parceria solidária

21 de dezembro de 2012
                    
A união de Brasil e Cuba na produção de vacinas contra a meningite para ajudar países africanos é destaque na revista Science
 
BRUNA SENSÊVE
 
Dois países que unem esforços e conhecimento científico para responder a um pedido emergencial da Organização Mundial de Saúde (OMS). A missão envolve ajudar nações do outro do lado do Atlântico que sofrem com o surto de uma doença potencialmente fatal e altamente contagiosa. Além do modelo de cooperação pouco usual, a iniciativa surpreende por não ter como atores principais nações desenvolvidas nem empresas multinacionais. A bem-sucedida parceria que permitiu a produção e distribuição de vacinas no chamado Cinturão da Meningite, na África, foi realizada por Brasil e Cuba e é um dos destaques da revista Science desta semana.
 
Apesar de a meningite ter ocorrências em todo o mundo, a maior parte dos casos é registrada na África, especialmente na época de seca, de dezembro a junho. Foi nesse período, em 2006 e 2007, que pelo menos 14 alertas de surtos em cinco países - Burkina Faso, Chade, Sudão, Uganda e República Democrática do Congo - elevou a preocupação quanto ao controle da doença. O cenário já dramático foi piorado com a escassez de vacinas disponíveis.
 
Foi nesse momento que o Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos (Bio-Manguinhos), da Fundação Oswaldo Cruz, e o Instituto Finlay, de Cuba, responderam ao apelo da OMS com a proposta de fabricação de uma vacina polissacarídea contra os sorotipos A e C da meningite, os mais comuns naquela região. O reconhecimento da aliança e a pré-qualificação das vacinas vieram logo em seguida. Desde o início do fornecimento, em 2008, até agora, foram distribuídas 19 milhões de doses, por meio de diversas organizações internacionais. Ao todo, 25 nações incluídas no Cinturão da Meningite foram beneficiadas.
 
Um detalhe que chama ainda mais a atenção na parceria entre Brasil e Cuba é que os dois países não sofrem com o tipo A da enfermidade. Ou seja, a vacina foi produzida exclusivamente para o atendimento do continente africano. O longo relacionamento científico entre as duas nações e o reconhecimento das capacidades individuais de cada uma são considerados os aspectos iniciais para que o projeto funcionasse. Desde a década de 1990, os governos brasileiro e cubano promovem a interação científica que permitiu o aumento da disponibilidade de produtos de saúde a preços mais baixos e voltados para as necessidades locais.
 
Cuba, com um registro positivo de inovação, criou uma vacina sintética contra as infecções pela bactéria Haemophilus influenzae tipo b (Hib), causadora de alguns tipos de meningite e pneumonia, e uma imunização contra a meningite BC. "Sua experiência foi fundamental para fornecer os princípios ativos da vacina contra a meningite AC", ressaltam os pesquisadores no artigo. O Brasil entrou com uma forte referência para a produção de vacinas e a utilização de um processo chamado de liofilização, capaz de melhorar a estabilidade do imunizante, o armazenamento e o transporte.
 
Segundo a diretora da Divisão de Biotecnologia do Instituto Butantan, Luciana Cezar Cerqueira Leite, o processo em que o Brasil se destaca, a liofilização, é uma forma de estabilizar o antígeno usado na vacina. "Trata-se, basicamente, de tirar toda a água, assim como aquelas sopas desidratadas, para poder estocar de uma forma mais fácil e simplificar a conservação. É um processo mais elaborado que o Brasil tem capacidade de fazer", detalha.
 
A diretora destaca que colaborações como essas estão surgindo cada vez mais, devido à comunicação facilitada entre países desenvolvidos e países em desenvolvimento. "É mais simples avaliar as possibilidades e ver uma sinergia para a produção." A associação também possibilitou um preço mais acessível. O produto pode ser negociado a US$ 0,95 a dose. Vacinas similares são encontradas por valores de US$ 15 a US$ 20 no mercado internacional.
 
Segundo um dos autores do trabalho publicado na Science, o professor associado do Centro de Desenvolvimento Sustentável da Universidade de Brasília Tirso Saenz, a maior parte das colaborações internacionais incluem elementos de interesse e desejos próprios para que a aliança beneficie todas as partes envolvidas. No entanto, as aproximações entre nações latino-americanas para a assistência podem ser vistas como retentoras de filosofias diferentes.
 
"Essa distinção dá um tom diferente para a colaboração. A solidariedade entre os países em desenvolvimento começaram a surgir na década de 1950 durante a busca pela independência de poderes coloniais." Atualmente, há um crescente espaço para essa interação, já que o mundo em desenvolvimento se tornou tecnologicamente capaz e ainda experimenta um crescimento econômico. Para Saenz, elas são promissoras para lutar contra muitos desafios comuns em saúde, agricultura e proteção ambiental (veja Três perguntas para).
 
Infecção
 
A meningite é causada por uma infecção bacteriana que atinge as membranas cerebrais responsáveis pelo revestimento e proteção do sistema nervoso central, conhecidas como meninges. O tipo da enfermidade que atinge os países africanos causa a morte em até 80% dos infectados. Um diagnóstico precoce e início imediato do tratamento com antibióticos é capaz de diminuir essas taxas para 5% a 10%, sendo que um em cada cinco pacientes curados apresentam sequelas neurológicas. As consequências devastadoras da doença fazem com que a vacinação em massa da população, principalmente em situação de epidemia, seja a melhor estratégia para deter o avanço da transmissão - que acontece por meio do contato com secreção das vias respiratórias, como tosse, espirro e saliva infectadas.
 
A vacinação periódica contra a meningite é, de certa forma, nova. Ela entrou para o calendário do Ministério da Saúde em 2010 e deve ser administrada em crianças em três doses: a primeira aos 3 meses de idade, a segunda aos 5 e a vacina final aos 15 meses. O tipo de vacina aplicada é do sorotipo C, mais comum no Brasil. Imunizantes quádruplos contra os tipos A, C, W135 e Y podem ser adquiridos na rede particular por valores entre R$ 100 e R$ 200. Marcos Cyrillo, membro da Sociedade Brasileira de Infectologia, calcula que no Brasil sejam feitas cerca de 20 mil notificações de meningite entre os tipos bacterianos, virais e fúngicos. "A ocorrência do tipo viral é mais comum e menos grave, se assemelha bastante a uma gripe e passa sem a utilização de medicamentos."
 
Três perguntas para
 
Tirso Saenz, professor associado do Centro de Desenvolvimento Sustentável da UnB Como o senhor vê a cooperação científica entre países da América do Sul para a confecção de medicamentos para outros continentes?
 
Em primeiro lugar, a cooperação não deve ser só científica, mas também tecnológica, para que os produtos dessa cooperação possam ser introduzidos na prática médica. Ou seja, o ciclo completo, ou a chamada inovação. Em segundo lugar, a cooperação deve começar por tratar de produzir produtos que resolvam os problemas de saúde dos próprios países. Se é possível exportar, muito melhor.
 
A colaboração científica para a saúde começa a ficar global, esse deve ser o futuro da ciência para combater grandes doenças?
 
O realmente importante é o espírito humanitário e de solidariedade mostrado por Brasil e Cuba para responder o chamado da OMS para resolver o surto de um tipo de meningite que estava causando graves danos, inclusive mortes em vários países africanos. Esse tipo de meningite não estava presente nem Brasil nem em Cuba. Foi necessário um esforço tecnológico e de complementaridade de ambas para desenvolver a vacina necessária para a África. Sem dúvidas, uma das questões importantes no futuro da ciência é intensificar esforços para combater as grandes doenças. A experiência do Brasil e de Cuba mostra esse caminho.
 
Que fatores facilitaram esse trabalho tão bem-sucedido?
 
Sem dúvida a cooperação frutífera há alguns anos entre as agências que fornecem as licitações necessárias para produtos farmacêuticos de ambos países (Anvisa, no Brasil, e Cedmed, em Cuba) viabilizou grandemente a mais rápida solução, dentro das grandes exigências requeridas. O elevado nível científico, tecnológico e produtivo de ambos países na esfera da biotecnologia com fins médicos foi decisivo. A parceria entre Brasil e Cuba na esfera da biotecnologia é muito ampla e continua se desenvolvendo com sucesso.
 
Fonte: Correio Braziliense


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