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Desafios da saúde 2005 & 2006

A. INTRODUÇÃO

Muda o Ministro da saúde. Já estamos na era Saraiva Felipe. A saúde é aberta à mudança em meio a uma das maiores crises de governo onde externam-se chagas sabidas e havidas há décadas. A novidade do “caixa dois” e da corrupção é tida como antiga e comum a todos os segmentos e partidos, com maior ou menos intensidade, neste ou naquele, hoje ou ontem.

A cortina de fumaça da teoria conspiratória e eleitoreira subestimou a inteligência coletiva e tentou manter escondido aquilo que sempre todos esconderam da justiça e dos cidadãos. Perpetrou-se uma das maiores conspirações reais deste país onde, alguns próceres da ética, conspiraram contra a confiança ingênua de milhões de brasileiros. Lancetado o tumor coletivo, temos que sofrer, convalescer e reviver. Melhores. Mais éticos. Mais fortes. Cheios de indignação e prenhes de esperança operativa.

No meio do furacão, temos o SUS em um novo recomeçar. O Ministério da Saúde tem uma característica única de mudança. A cada novo Ministro muda um mundaréu de gente entre equipe dirigente e técnicos operadores. Há anos, grande parte dos que lá trabalham, são de fora do quadro. Alguns cargos em comissão. Uma imensa maioria terceirizada via alguma I.T.M.O. - Internacional Terceirizadora de Mão-de-Obra: OMS-OPAS, UNESCO, PNUD etc. ou N.T.M.O, as tupiniquins, de menor fôlego e prestígio (atuam mais em nível local!). Se terceirizados, ou demissíveis ad nutum, os que tocam as questões de cerne da saúde, a cada novo Ministro entra uma turma nova e é um novo aprender. Um novo imaginário.

O padecimento que a saúde vai amargar é muito mais pelo ônus da mudança em si, que por qualquer dos dirigentes que assuma. Ainda não tenho uma visão muito clara do que vai acontecer na particularidade, no dia a dia das coisas da saúde. A história é ingrata conosco.

A esquerda lutou para chegar lá no Ministério da Saúde... chegou quase PO (puro sangue), de chapa inteira. A custo, aceitou, de contrabando, alguns aliados, que, mesmo assim, não tinham todas as portas abertas e nem a todo tempo. Perdeu-se tempo no digladiar romano, típico das facções. Perdeu-se tempo nas disputas intestinas quando se podia ter ido muito mais à frente e mais rápido. Página virada. Vamos em frente.

Bola prá frente e vivas aos que chegam para que o façam bem e administrem melhor ainda!

B. RECONHECENDO OS FEITOS

Dois anos e meio no MS dá para se fazer muito. Primeiro os elogios, as flores, os bens. Partindo sempre do princípio que o esperado é que aconteçam coisas boas, o certo... Isto é a obrigação. Não é mérito. Sucessos houve e muitos: manter a máquina, dar continuidade e aprimorar um punhado de coisas. Umas com acerto total. Outras, apenas parcial. Mais outras com reconhecidos erros.
Vamos cantar loas e reconhecer os muitos acertos do período Janeiro de 2003 a Junho de 2005, exatamente 2 anos e meio ou 30 meses de ação da equipe Humberto Costa. Os dados abaixo citados constam da publicação do MS – “Balanço da Saúde” Junho-2005:

“ATENÇÃO BÁSICA:

Aumento de 31,89% do PSF: 22.683 equipes cobrindo 73,6 milhões de brasileiros, em 4837 municípios (676 municípios a mais); 198.743 milhões de agentes de saúde cobrindo 101,5 milhões de brasileiros; mortalidade infantil em 26,7/1000 nas áreas do PSF com queda de 14,69%; mortes por diarréia caíram 36,6% e infecções respiratórias caíram 24,24%; melhora do financiamento das equipes chegando até a 60% do custo de uma equipe; atualização do PAB para R$13 por habitante; financiamento de equipe de saúde bucal e aumento de 17,8% nos incentivos de farmácia básica, epidemiologia, vigilância sanitária; tratamento diferenciado no PACS/PSF da Amazônia Legal e de áreas indígenas.

SAÚDE BUCAL:
Brasil Sorridente; Centro de Especialidades Odontológicas (137 em 86 municípios; de 4.261 equipes de saúde bucal em 2002 passou a 10.628 equipes beneficiando 54,68 milhões de brasileiros.

URGÊNCIAS:
SAMU – Serviço de Atendimento Móvel de Urgência – dá cobertura a 275 municípios com população de 62,5 milhões de brasileiros; 150,4 mil atendimentos mês; mais 2.749 leitos de UTI.

ASSISTÊNCIA FARMACÊUTICA:
Farmácia Popular (95 itens): 39 implantadas (200 em instalação); 7 milhões de remédios fornecidos a preço de custo; recursos para medicamentos cresceram de 2,4 para 4,3 bi de reais; gastos com medicamentos de alto custo eram 467 mi em 2002 e cresceram para 980 mi em 2005; isenção de impostos para 1000 produtos; proposta no congresso para venda subsidiada de remédios nas farmácias privadas; possibilidade de venda fracionada de medicamentos; investimento na produção de laboratórios oficiais (de 20 mi para 80 mi de reais); portal de compra de medicamentos.

VIGILÂNCIA SANITÁRIA:
Criação da Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (regula mercado e define critérios de reajuste); mais rigor no registro de medicamentos (8 resoluções: bulas com linguagem mais simples; maior controle de farmácias de manipulação; boas práticas para venda de medicamentos etc.).

TRANSPLANTES:
Maior sistema público de transplante do mundo: cresceu 36,1% (de 7.981 para 10.960); duplicam doadores de medula óssea (1.408 doadores em 2004); primeiros transplantes com sangue do cordão umbilical brasileiro;

CIÊNCIA E TECNOLOGIA:
Qualificação do atendimento no SUS: investimento de 115 milhões de reais; maior estudo do mundo com células-tronco para tratamento de cardiopatia; novos estudos para oito áreas: saude mental, saúde indígena, neoplasias, avaliação econômica e análise de custos; hanseníase, chagas, Amazônia, órteses e próteses; criação de Hemobras para auto suficiência na produção de hemoderivados; mais rigor nas compras com redução de 70% nos preços de hemoderivados.

PLANEJAMENTO FAMILIAR:
Anticoncepcionais disponíveis em 5.200 municípios; primeira fábrica de preservativos com látex dos seringais da Amazônia; educação para redução da gravidez precoce.

SAÚDE DA MULHER E DA CRIANÇA:
Pacto para redução da mortalidade materna e neo-natal, seminários, qualificação de equipes; regulação do atendimento às vítimas de violência sexual e em situação de abortamento; nova caderneta da criança; rede latino-americana de bancos de leite humano.

ATENÇÃO ESPECIAL:
Reforma Psiquiátrica: implantação de mais 218 Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) com ampliação em 47,8%; reduzidos 5.519 leitos psiquiátricos; 1.264 pacientes com transtornos mentais retomaram o convívio social, com uma ajuda de custo de R$240,00. População Negra: maior capacitação para atendimento de patologias ligadas à raça como a anemia falciforme para o que se adquiriam filtros e bombas de infusão representando um investimento de R$1,3 mi. Plano Nacional de Saúde no Sistema Penitenciário. Centros de referência de Saúde do Trabalhador: criação de 111. Combate ao Trabalho Infantil. Ampliação do atendimento aos idosos: vacina contra gripe e pneumococo e gasto com idosos representando 25% do gasto de internações pelo SUS. Melhor atendimento à saúde da população indígena, aos quilombolas e de assentamentos. Em 2005 existe cerca de R$1 bi para atendimento ao saneamento de municípios com menos de 30 mil habitantes.

VIGILÂNCIA À SAÚDE:
Controle do Dengue com queda de 66,5% em 2004. Combate à tuberculose com 50% mais de recursos. Brasil próximo de eliminar a Hanseníase. Melhor controle de Hepatites Virais, Malária, Chagas, Febre Amarela, Leishmanioses, Raiva. Vacinação de 12,9 milhões de idosos (85% do total). Cobertura contra pólio e sarampo próxima a 100%. Laboratórios Públicos de alta segurança: 12 previstos e 4 já instalados.

AIDS:
Beneficiadas 170 mil pessoas. Mais diagnóstico. Mais uso de preservativo. Oito medicamentos antiaids fabricados no Brasil.

BRASIL SAUDÁVEL:
Estímulo a hábitos saudáveis. 230 núcleos de atividades físicas até 2006. Controle do fumo em locais públicos. Guia de alimentação saudável.

ÁLCOOL E TABAGISMO:
Medidas para reduzir o consumo do álcool. Assinatura do tratado internacional para controle do tabaco. Alertas mais impactantes nas embalagens de cigarro. Tratamento para largar o cigarro disponível no SUS.

ESTRATÉGIAS DE COMUNICAÇÃO:
Sucesso nas vacinações e no aumento da doação de órgãos. Tuberculose e Hanseníase foram alvo de campanha de comunicação inédita.

RESPONSABILIDADE SANITÁRIA:
Encaminhamento para discussão de uma proposta de Projeto de Lei sobre a Responsabilidade Sanitária dos gestores que não cumprem metas de saúde e que serão punidos. Ação no Rio de Janeiro visando melhorar o atendimento à população.

FINANCIAMENTO, MAIS RECURSOS PARA ESTADOS E MUNICÍPIOS:
Aumento no valor nominal entre 2002 (16,68 bi) e 2004 (20,22 bi de reais) repassado ao conjunto de estados e municípios.

REAJUSTE DE TABELAS:
Foram feitos reajustes nas tabelas de vários procedimentos como parto, internações, diárias de UTI tipo II, mamografias, ortopedia, ultra-som, patologia clínica, procedimentos diagnósticos, endoscopia, ECG e EEG, anatomopatologia, biópsias hepáticas,

REESTRUTURAÇÃO DOS HOSPITAIS:
Reestruturação para os Hospitais Universitários, hospitais de pequeno porte e hospitais filantrópicos (em elaboração).

ATENÇÃO HOSPITALAR:
Aumento do número de cirurgias de média complexidade. Novas diretrizes para cirurgias de alta complexidade. Prioridade ao atendimento humanizado no SUS.

FORMAÇÃO PROFISSIONAL:
Fora, 200 mil trabalhadores inscritos nos cursos de formação profissional. Investimento de R$450 mi. Capacitação de Agentes Comunitários. Trabalho integrado com o Ministério da Educação para o debate sobre a mudança na graduação. Apoio de R$20 milhões a 30 unidades de ensino para a reformulação. Apoio à residência médica: 2 mil residentes. Quatro mil alunos cursando especializações apoiadas pelo Ministério da Saúde. Programa de Bolsas para Educação pelo trabalho (Lei 11.129-30-6-2005). Diretrizes para o Plano de Cargos Carreira e Salário do SUS, em audiência pública. Foram criados 110 mil postos de trabalho com a implementação do SUS.

COMBATE À CORRUPÇÃO:
Demissão de 82 servidores por improbabilidade administrativa, 278 processos administrativos; comissão permanente de auditoria interna; pregão eletrônico; intensificação das atividades da auditoria.

CONTROLE SOCIAL:
Estímulo à gestão participativa no SUS com qualificação de 31 mil conselheiros de saúde em todo o Brasil; realização da 12ª. Conferência Nacional de Saúde precedida por 3.640 conferências municipais e 27 estaduais; participação de 300 mil pessoas; ampliação do canal de comunicação com a sociedade.

COOPERAÇÃO INTERNACIONAL:
Brasil-Cuba: parceria na produção de biofármacos; vinte e três países participam do programa de cooperação brasileiro para tratamento de pacientes com AIDS; ajuda a vítimas do tsunami, do incêndio no Paraguai e do furacão no Haiti; aliança com a Argentina e cooperação com a Bolívia.

SAÚDE SUPLEMENTAR:
Ação na justiça impede aumentos abusivos de planos; avaliação permanente de operadoras de planos; parcerias com órgãos de defesa do consumidor; aperfeiçoamento do sistema de ressarcimento ao SUS por serviços prestados aos planos.”

C. CHECANDO OS NÓS MAIS EVIDENTES QUE DIFICULTAM A GARANTIA DO DIREITO A VIDA E À SAÚDE DOS CIDADÃOS BRASILEIROS JÁ DISCUTIDOS ANTES E DEPOIS DO INÍCIO DO GOVERNO LULA

A análise fria dos percalços pode parecer dura, mas é a realidade. Confirmou-se minha velha teoria: a briga na saúde não é entre os extremos caricatos do conservador versus progressista, de direita e esquerda. Há unanimidade que num país rico, de povo pobre, tem espaço para um sistema público e outro privado e que é importante para a “pax-social” garantirem-se os dois. Direita e esquerda defendem a saúde sob motivos até mesmo antagônicos. Mas, defendem. O que pega é a briga entre o não caricato, mas, real, do campo econômico com o campo social. Está aí a proposta do Déficit Nominal Zero que contrapõe o social e o econômico propondo diminuir o gasto social para favorecer a remuneração, a juros, do capital. Este embate teve várias batalhas. No governo FHC foram vários combates: a mudança constitucional mexendo na integralidade e na universalidade (tentativa de mudar a CF e introdução do “nos termos da lei” logo após o “saúde é direito de todos e dever do estado”); a dívida do Governo junto ao FAT e que foi paga com recursos específicos da saúde; a CPMF, o dinheiro a mais para a saúde e que pouco significou quando o Governo diminuiu as outras fontes da saúde; o tombo da PEC-169 que virou a EC-29 da redução a menos da metade da obrigação financeira da União com a saúde e aumento de contribuição em 20% para estados e 50% para municípios; a tentativa de reduzir ainda mais os recursos da união para a saúde usando como base de cálculo o empenhado fixo e não o móvel; o uso do crescimento nominal do PIB futuro e não do passado impedindo correções de valores.

Este embate econômico X social continuou, sem cerimônia, no Governo LULA (real, ocorrido, e não reduzível à paranóia de “inimigos”): o uso de 5 bi do fome zero contabilizado duas vezes, uma como saúde e outra como Fome Zero; a defesa de gasto com saneamento como responsabilidade financeira da saúde; a tentativa de desvinculação das receitas de estados e municípios diminuindo a base do percentual dos recursos da saúde: a noiva prometida ao FMI-BIRD em carta do governo; agora, a desvinculação do numerador (queda do percentual constitucional da saúde) ressuscitada no atual “déficit nominal zero”; a farmácia popular como a introdução oficial do co-pagamento na saúde, direito universal da integralidade (receita do BIRD há mais de 10 anos atrás e só conseguida na prática num governo denominado social... a história saberá identificar qual Governo e quais técnicos de saúde, descumprindo a CF introduziu o co-pagamento da saúde pública no Brasil! No princípio primeiro, o remédio...abrindo a porta para a consulta, o exame, a internação etc.! com modestas taxas de uso... com até 90% de desconto!!!) Não nego que isto possa ser mudado, como é em outros países, mas necessário se faz abrir o debate com a sociedade e MUDAR A CONSTITUIÇÃO FEDERAL!

Além dos problemas relativos ao montante de recursos descritos acima. Outros graves problemas ocorreram em relação ao financiamento e outras áreas como a de programas. Destaques para:
• o débito de cerca de 2 bilhões de reais da União com a saúde como somatória dos anos 2001, 2002, 2003 por descumprimento da EC-29;
• se em 2005 for pago o empenhado em 2004, segundo o TCU teria sido cumprida a EC-29 relativa a 2004;
• persistiram e aumentaram as formas ilegais de transferências financeiras para estados e municípios, relativos aos critérios e proporções de transferências: as 101 caixinhas de repasse, características do “planejamento normativo centralizado” chegaram ao maior número contabilizado em todos os anos anteriores;
• o verticalismo de compras centralizadas de medicamentos e de materiais como o do programa de saúde bucal;
• manutenção e expansão dos programas de planejamento central pretendendo manter características únicas, num país continental, cujo preceito constitucional é a descentralização e jamais a simples desconcentração; um exemplo seria o PSF que poderia ser mais desburocratizado com genótipo igual e fenótipo diferente, com referência garantida, com equipe multidisciplinar e apoio matricial sem ser matriarcal;
• a proliferação de portarias (“portariofilia”) ainda exacerbada com mais de 10 portarias a cada dia útil;
• a tentativa de ficar reescrevendo definições de termos, muitas vezes com conceito equivocado e mesmo errôneo, quando a necessidade era de normatizar sistematicamente as operações;
• o não ter se empenhado mais tomando medidas gerais mais efetivas em relação às demandas judiciais sobre o SUS que atingiram principalmente centenas de gestores municipais; na falta de uma açào mais efetiva os gestores da saúde foram impingidos, em nome da integralidade, a praticar na saúde, no Brasil, a iniqüidade de dar mais para quem mais pode e mais tem: o Complexo Médico Industrial, Comercial e Midiático - CMICM;
• a ineficiência do enfrentamento dos grandes problemas gerenciais dos recursos humanos do SUS: a terceirização contratação indireta do PACS-PSF (leniência em considerar ilegal permitindo que este número crescesse mesmo sabendo da orientação do MPT); o pagamento de profissionais sem contrato como o “código sete”; mantendo a terceirizando mão-de-obra para o MS (uma das conseqüência é o caos de que, a cada mudança de Ministro muda grande parte dos servidores) etc. etc.
• a lentidão em resolver a defasagem em preços e prazos para pagamento de serviços comprados para completar o SUS, principalmente os de menor complexidade. A prova cabal foram as dezenas de portarias publicadas no final desta administração: se reconhecida a necessidade não poderia ter sido feito isto anteriormente?

Antes da posse do Lula e logo depois dela, escrevi dois textos que se completavam: os desafios 2003, antes de 2003 e os desafios 2003 já em 2003.
Vou buscar nele alguns pontos para checar se tiveram alguma modificação.
• Financiamento insuficiente e ilegal: na responsabilidade sobre o montante legal não atingido, na distribuição entre as esferas de governo e na eficiência dos seus gastos. PERMANECE.
• Desconcentração como opção de descentralização virtual: descumpre-se a lei sob o pretexto de que as esferas estaduais e municipais sub-nacionais são incompetentes e corruptas. Descumpre-se a lei sob o pretexto que os demais vão descumprir. É a chibata antecipada! Em quem é o lado mais fraco para reclamar. Mas se o município descumpre uma portaria, ordem de recolhimento nele! PERMANECE.
• Recursos humanos insuficientes, muitos despreparados, desassistidos, com relação de trabalho espúria e precária e sob o tacão da LRF, em muito inadequada especificamente à saúde. Profissionais de saúde: maior problema e por onde passa a única saída para o SUS. PERMANECE.
• Auditoria e controle fora da lei. Exercida sobre terceiros e nunca sobre suas próprias competências e esferas, ainda que se trate de AUDITORIA INTERNA!!! SNA do MS mais controla estados e municípios que as ilegalidades do próprio MS; idem para o ESTADO, incapaz de controlar a auditar as Secretarias Estaduais de Saúde, dedicando-se a fazer isto sobre os municípios. PERMANECE.
• Processo regulatório excessivo e irresponsável (mais de uma dezena de portarias por dia útil nos últimos anos incluindo-se 2003, 2004), sem a mínima integração entre áreas e onde cada setor do MS entende que o seu é único ou o mais importante e regula particularizadamente, sem nenhuma visão de conjunto. PERMANECE.
• Programação verticalizada e desconcentrada; fragmentação das ações e programas criando feudos e “currais” que são mimetizadas pelos estados e municípios, pela própria cadeia de mando e autoridade. PERMANECE.
• Perda da visão da integralidade que, quando fragmentada em programas verticalizados, se torna impraticável para a equipe local que, na maioria dos municípios pequenos é feita de um único profissional. PERMANECE.

D) A SÍNTESE DOS DESACERTOS VELHOS E NOVOS
A RAIZ DO CAOS: as três esferas de governo responsáveis pela saúde (Ministério da Saúde, Secretarias Estaduais e Secretarias Municipais) estão descumprindo a legislação brasileira. PERMANECE.

O DESCUMPRIMENTO DA LEI: os documentos legais do Ministério da Saúde como portarias, normas, instruções normativas dos últimos anos, na sua quase totalidade, ferem a legislação maior. Sob pretexto de que cumprir a lei não daria certo, que estados e municípios são incompetentes e corruptos, optaram, ao arrepio da lei, por fazer a desconcentração tutelada e não a descentralização constitucional! Governo Lula, mesmo com dois anos de mandato, ainda não enfrentou este desafio e praticamente manteve a mesma pratica desconcentratória e não assumiu a constitucional descentralizatória. PERMANECE.

PPI, PDR, PRI E OUTROS PÊS... Multiplicaram-se planos e instrumentos, com suas siglas e seu ritmo, sem nenhuma ligação PPA, LDO, LOA e cujos prazos não mantém nenhuma ligação com os prazos legais da PPA, LDO, LOA. Instrumentos são ferramentas úteis e necessárias, mas não podem ser excessivos e, no caso do público, nem usados para descumprir ou desdenhar da lei. PERMANECE.

O PLANO DE SAÚDE, previsto nas leis 8080, 8142 pode conter em seu corpo vários componentes como o de integração, regionalização e investimento. O que não pode é multiplicarem-se os planos e instrumentos burocratizando a operação. PERMANECE.

PLANEJAMENTO PELA DEMANDA é a antítese da proposta SUS. É planejar pela pressão de consumo e não pelas necessidades priorizadas. Fruto do viés histórico. Nunca daremos conta desta corrida. Os indutores da demanda que levam sempre vantagens pessoais ou comerciais dela, (fabricantes, profissionais, marqueteiros) são muito mais turbinados nesta corrida. Ganham sempre. De outro lado, nunca foi feito com seriedade e esmero um trabalho continuado de desmedicalização, de desospitalização, de promoção, de educação em saúde. Estes sim capazes de induzir um outro modelo de saúde, diferente do modelo medicalizado, imaginolizado, hospitalizado e superespecializado típico destes tempos. PERMANECE.

O FINANCIAMENTO ILEGAL DA SAÚDE PELO MS - ilegal no montante geral do MS pela base fixa, pelos contingenciamentos, pelas despesas acopladas e não devidas, pelos restos a pagar sem lastro no fundo, no montante a ser transferido para estados e municípios, na forma ilegal de transferências onde apenas um pequeno percentual está sendo transferido pelo quociente populacional (enquanto pela lei deveria ser 100% ou no mínimo 50%) e os demais critérios são descumpridos acintosamente. PERMANECE.

DESCENTRALIZAÇÃO: o MS partindo da incompetência de Estados e principalmente de Municípios, do grande risco de, ao descentralizar para eles, estes entes federados (autônomos segundo a cf) desviarem os recursos transferidos, decreta-se (de fato e não de direito!) que a lei maior não vale e pratica-se a “desconcentração tutelada”. Diz-se a estados e municípios o que devem fazer, como devem se habilitar e desabilitar. Fazem milhares de “aprovações” em Brasília a cada programa, a cada campanha, a cada fila de cirurgia!
PERMANECE.

E) SAÍDAS LEGAIS : GRANDE PARTE DELAS JÁ APONTADAS EM TEXTOS ANTERIORES
O caminho para tudo começar direito é ver o que está na lei e cumprir, ou tentar cumprir ... Cobrar e exigir que os agentes públicos, administradores públicos, cumpram a legislação, é visto como anacronismo de inimigos da modernidade e da pátria. Mas nós administradores e servidores públicos só podemos FAZER O QUE A LEI MANDA. O executivo pode tentar mudar a legislação, enviando projetos de leis ao legislativo, quando entender que a lei é anacrônica, insuficiente etc. Mas, enquanto não se muda: cumpra-se.

1.HIBERNAR O ILEGAL, ATÉ SE ACHAR A SAÍDA LEGAL - Hibernar todas as NOBS, NOAS e adjacências até se ter uma proposta para se operacionalizar a saída de forma minimamente legal. A NOAS 2001 foi cancelada, sem ter sido implantada. Depois de mudada e transformada em NOAS 2002 também pouco ou nada ocorreu em sua vigência em 2002. Vieram as portarias de 2003 que a modificaram a NOAS 2002, não revogada,e nada aconteceu. Depois as portarias de setembro de 2004 e continua sem nada acontecer. Daí se pode concluir que não há necessidade de regime de urgência-urgentíssima para a vivificar! O que “mata” por inanição o sistema hoje é o desfinanciamento federal e estadual que não precisam de NOBS E NOAS para aumentar, basta se cumprir a EC por inteiro! Tenho já visto pessoas que defendem que o Ministério da Saúde tem que refazer a NOAS, fazer adaptações etc. Sou contrário. Re-arranjar a NOAS, hoje, significa legitimá-la e capitular diante da missão maior: cumprir a lei. Dar um jeitinho para melhorar a NOAS é aceitá-la! No momento em que se tentar mexer na NOAS , mas mantê-la, passarão os novos dirigentes do Ministério da Saúde a serem igualmente responsáveis pelas suas ilegalidades. Não se pode aperfeiçoá-la sem a estar legitimando. Nada disto tem sentido se ela é de concepção e prática ilegal. Sua textura, de processo a conteúdo, infringe a atual legislação e portanto, será jamais legitimada. É um factóide, uma virtualidade. No mínimo uma esdruxulice. PERMANECE COMO SAÍDA.
2.PROMOÇÃO, PROTEÇÃO E RECUPERAÇÃO - O caminho único a ser trilhado é o cumprimento do bloco de constitucionalidade: fazer promoção da saúde (mexer com causas) proteção da saúde (mexer com riscos) recuperação da saúde (mexer com agravos) cumprindo as quatro funções constitucionais: regular, fiscalizar, controlar e executar. Chega. Não se invente mais nada. Nem mais explicações. Nem mais regras. Cumpra-se e nada mais!... PERMANECE COMO SAÍDA.
3.PRINCÍPIOS DO SUS - Os princípios pétreos do sus deverão ser seguidos, sem precisar de mais definições, redefinições, repaginações, declarações de intenções ou explicações deles. Cada grupo que entra no Ministério, tenta descobrir o SUS e começam-se novas definições para coisas velhas já definidas desde o início. Muitas vezes, uma boa lida na Constituição e na Lei 8.080/90 mataria a sede de novidade de muitos. A Lei pode ter seus defeitos, mas tem muita coisa boa e muitas respostas para coisas que ficam inventando, como se nada estivesse normatizado... Saúde é direito do cidadão e dever do estado com responsabilidade das três esferas de governo com suas competências constitucionais e autonomia constitucional de ente federado. Seus princípios inarredáveis: universalidade, igualdade (equidade), integralidade, intersetorialidade, resolutividade, base epidemiológica do planejamento, autonomia das pessoas, direito à informação, descentralização, regionalização, hierarquização, gestor único em cada esfera, financiamento tripartite e participação da comunidade, etc. Tem outro tanto na cf, na 8080 e 8142, mas aí estão os ideais, centrais e essenciais. Nenhuma portaria pode mudá-los ou contrariá-los, por livre arbítrio e pensar de técnicos. Chega de atos declaratórios de princípios, lindos e perfeitos, seguidos de recheios, em entrelinhas, de exatamente o contrário. É só ver os grandes títulos de capítulos da NOAS que todos aplaudimos por achá-los ótimos e legais. Daí, a concordar com o recheio vão anos luz de distância. PERMANECE COMO SAÍDA.

4.DESCENTRALIZAÇÃO – As competências em saúde, antes da cf, estavam em outros locais, em outras esferas de governo. O que se tem que fazer agora é, urgentemente, passar de uma esfera a outra (descentralizar o fazer) seguindo a CF e a Lei 8080. Sem condicionantes ilegais e sem presunção de incompetência. Descentralizar competências por mandado constitucional é diferente de transferir competências próprias por acordo de vontade com a outra esfera. No primeiro caso: é obrigatório transferir, tem-se que passar a competência, o dinheiro (cooperação financeira) e o saber de quem estava fazendo aquilo (cooperação técnica). Conseqüente: ninguém pode dizer “não vou passar isto ou aquilo”, “ele (município) não tem competência para fazer isto ou aquilo...” Etc. O não fazer isto, pressupõe descumprimento da lei com as sanções legais administrativas e do judiciário. Jamais com punições prévias praticadas por ente público a quem não cabe este direito. PERMANECE COMO SAÍDA.

5.FINANCIAMENTO DA SAÚDE - Ainda que o governo federal arrecade os recursos, seus recursos não são dele, são RECURSOS NACIONAIS das três esferas de governo a serem divididos baseado nas competências de cada uma delas. Hoje, depois da EC-29, ficou consagrado o que a CF em 1988 já, implicitamente, garantia, que a transferência de recurso do Ministério da Saúde para Estados e Municípios, é uma TRANSFERÊNCIA CONSTITUCIONAL. Os estados recebem dinheiro federal e arrecadam o seu próprio e devem repassar dinheiro para os municípios como cooperação técnica e financeira. É comum que defensores da recentralização combatam esta lógica constitucional com a parcialidade de dizer que não se pode reduzir a função do Ministério da Saúde a ser repassador de recursos. Ele repassa recursos para a execução de planos de saúde municipais e estaduais, que, deveriam estar todos eles consubstanciados em um plano nacional. Definir diretrizes nacionais, decidir algumas prioridades nacionais, programas estratégicos nacionais é papel do MS. É papel dos Estados e Municípios terem plano e o cumprirem. Nesse passo, uma lei de responsabilidade sanitária poderia punir quem não o fizesse. Segundo eles, irresponsavelmente apenas alocando recursos nos estados e municípios. Existem três preceitos fundamentais da constituição federal: as competências de cada esfera, a cooperação técnica de quem antes tinha competência e a transferência e cooperação financeira de quem arrecada para quem deve executar (transferência constitucional). PERMANECE COMO SAÍDA.

6.FINANCIAMENTO DO MS PARA A SAÚDE – MONTANTE DE RECURSOS - O montante a ser transferido obrigatoriamente para Estados e Municípios. Este total representa todo o dinheiro que o MS gastava com suas competências que, não são mais dele. Isto quer dizer: todo o dinheiro de assistência do antigo INAMPS, somado a todo dinheiro de assistência da Fundação SESP e SUCAM (hoje FUNASA) acrescidos do dinheiro dos programas, antes tocados pelo Ministério da Saúde como vacinas, controle de doenças infecciosas etc.. Este é o básico que será somado aos outros “dinheiros” da cooperação técnica, dos investimentos etc Tudo isto com o recurso corrigido, a cada ano, no mínimo pelo montante do orçamento. PERMANECE COMO SAÍDA.

7.FINANCIAMENTO DO MS PARA A SAÚDE – PARTIÇÃO ENTRE ESTADOS E MUNICÍPIOS - A partição entre Estados e Municípios, deste montante deve ser segundo a Lei 8142: no mínimo 70% deste dinheiro para os municípios e o restante para os estados. PERMANECE COMO SAÍDA.

8.FINANCIAMENTO DO MS PARA A SAÚDE – CRITÉRIOS DE TRANSFERÊNCIAS CONSTITUCIONAIS - Os critérios de distribuição do montante devem ser obedecidos pelo MS dentro da seguinte fórmula de distribuição: 50% pelo quociente populacional (montante de dinheiro dividido pela população e criado um per capita) e os outros 50% por outros critérios (epidemiologia, demografia, rede serviços, desempenho (técnico, econômico e financeiro) ano anterior, dinheiro próprio, previsão do plano qüinqüenal (hoje PPA de 4 anos), serviços prestados para outras esferas de governo. Importante: enquanto não regulamentado este artigo 35 da 8080 deve-se cumprir a 8142 que é categórica ao determinar que 100% dos recursos nacionais que estão com o MS devem ser repassados pelo quociente populacional (montante de dinheiro, dividido pelo número de brasileiros e distribuído segundo a população de estados/municípios). Isto só seria possível com mais recursos, pois seria inconcebível e caótico, hoje, simplistamente diminuir recursos de uns, para aumentar para outros. O critério misto, semelhante ao sabiamente previsto no Art.35, continua sendo o melhor: parte global, parte por produção e parte por características locais (epidemiológicas, demográficas etc.) PERMANECE COMO SAÍDA.

9.FINANCIAMENTO ESTADUAL PARA A SAÚDE - Cumprir a legislação: fazer as competências estaduais e oferecer cooperação técnica e financeira aos municípios. As secretarias estaduais de saúde devem exigir de seus governadores o cumprimento da EC-29 em relação ao financiamento. Tem vários Estados sem o mínimo de compromisso com financiamento próprio da saúde. Sair da tirania de fazer politicagem com saúde favorecendo município a, b ou c conforme conveniências político-partidárias. Transferir recursos direta e automaticamente por critérios límpidos, transparentes e na base da equidade. Sair do viés colonial de tiranizar os municípios e ser a Secretaria Estadual de Saúde que cumpre a lei. Que apóia, ajuda, contribui e faz a cooperação técnica verdadeira, associada à cooperação financeira. PERMANECE COMO SAÍDA.

10.FINANCIAMENTO MUNICIPAL PARA A SAÚDE. Cumprir a legislação. Preparar-se para assumir as competências de fazer as ações e serviços de saúde colocando os recursos próprios para a saúde segundo a ec-29, usando os recursos com a maior eficiência possível. Deixar de usar a saúde para fazer política do mais baixo nível e fazer a grande política de saúde onde os cidadãos sejam vistos pelas suas necessidades e não pelas suas relações político, partidárias e de amizade. PERMANECE COMO SAÍDA.

11.GESTÃO POR METAS. Meu amigo Mozart de Oliveira, competente e comprometido ator do SUS e que já ocupou vários cargos e funções públicas no SUS, há anos defende a gestão por metas. Introduzo esta questão como uma das saídas que devemos considerar. As metas são objetivos quantificados. Temos que colocar nossos objetivos como o centro do sistema: ajudar as pessoas a morrerem o mais tardiamente possível e com qualidade de vida, a não ficarem doentes, e se isto acontecer, que se recuperem rapidamente,sem seqüelas. No fundo o objetivo maior de todo o sistema com suas ações e serviços: ajudar as pessoas na conquista do seu bem-estar, de sua felicidade. Precisamos pautar nossa ação pelos objetivos maiores e finais e não apenas pelas ações intermediárias. Nossa prática histórica foi de nos perdermos por aí mesmo: no caminho, no processo, na quantificação dos instrumentos. Definidos objetivos (todos já explícitos na legislação do SUS) o passo seguinte seria o estabelecimento de metas (grandes, médias e pequenas) com as competências partilhadas e compromissadas pelas três esferas de governo. As metas têm que ter, cada uma delas, seus indicadores e que sejam de resultados (direta ou indiretamente) e não de processo: mortalidade infantil, mortalidade materna, mortalidade por doenças ou agravos evitáveis ou suscetíveis a tratamentos etc. Vamos fazer o aprendizado, vamos criar novas metas e novos indicadores, basta passar a dar valor e usá-los mais. Permanentemente o acompanhamento, verificação e divulgação de metas e resultados e seus instrumentos de verificação. Por e para todos: gestores, técnicos, legislativo, sociedade (conselhos e cidadãos individualmente). Metas não cumpridas devem ser muito bem avaliadas. Se os problemas são técnicos é a hora da cooperação técnica prevista na CF (30,7). Negligência, corrupção, descompromisso: usar os mecanismos legais de punição da improbidade administrativa CF (37) que já existem em quantidade, precisando apenas ser cumpridos.

12.RECURSOS HUMANOS. Os embates são velhos e batidos. Temos a questão da formação do pessoal da saúde para o SUS legal exigindo investimento continuado no aparelho formador. Na graduação e na pós-graduação. O SUS é o grande e, por vezes, único campo de estágio para a graduação em saúde e ainda financia boa parte das bolsas de residência médica, sem contudo garantir que a proposta SUS seja aquela praticada e desenvolvida nos serviços que financia. Temos a questão da contratação do pessoal da saúde pública quando o concurso público é preceito legal e a terceirização de pessoal para trabalhar no próprio público é a prática. Temos os terceirizados precarizados, com terceirizadoras fajutas, sem base legal ou terceirizadoras legalmente constituídas, com práticas trabalhistas corretas, mas operando na ilegalidade de fornecer mão de obra para o público saúde. Muitas vezes o custo da terceirização é elevado, outras ele fica baixo pois as terceirizadoras são filantrópicas e têm isenções fiscais (governo lesando governo e depois reclamando do déficit da previdência social!). Alega-se a garantia de ser gente da comunidade. Mas isto gera, em vários locais, indicações políticas e instabilidade a cada mudança de governo. Que o digam as administrações municipais e a mudança, quase total, nas equipes de PACS-PSF, com a mudança dos prefeitos. De outro lado as críticas à estabilidade pública com alguns ou até muitos servidores, descompromissados com a sociedade. Quando vai se resolver esta questão? Não se pode pensar uma solução inovadora mesmo que seja necessário se encaminhar uma PEC? Isto é saída geral que pode dar um salto de qualidade e resolver inúmeros problemas locais que assoberbam os gestores. Também uma boa lei de responsabilidade sanitária pode ser a saída.

13.AS DEMANDAS JURÍDICAS. Tem-se que chegar a um entendimento em âmbito nacional. Não se pode mais permanecer nesta avalanche de ações judiciais. As 250 mil ações previstas para este ano equivalem a 1000 ações por dia útil!!!! Elas pretendem garantir a integralidade turbinada, mas desregulada, em nome da justiça e muitas vezes contra a igualdade e equidade de inúmeros cidadãos. Tem caso de ação turbinada de gastos com produto de eficácia não comprovada, para um único paciente, que representa o equivalente ao dobro do Piso da Atenção Básica do Município para atendimento de todos os 200 mil habitantes do município. Fora do plano de saúde. Fora do orçamento legal aprovado. Aí as medidas centrais poderiam ser altamente benéficas a todas as esferas de governo. Se o plano de saúde é a base de todas as atividades do SUS, discutido, aprovado e fiscalizado pela população, através dos conselhos de saúde, será que cabe ao judiciário impor terapêuticas e procedimentos não previstos no plano de saúde? Melhor dizendo, contra o plano de saúde, uma vez que um só medicamento, para uma só pessoa, pode fazer esboroar todo o plano de saúde discutido com a população. E mais: um plano de saúde legalizado no legislativo pelo PPA, LDO e a Lei Orçamentária Anual. Não se consegue chegar num consenso sobre a regulação do Sistema Único de Saúde, com o mesmo entendimento entre o público executor e o público promotor ou julgador?!!! Uma Câmara Nacional de Medicamentos, Materiais, Equipamentos e Procedimentos onde se discuta a regulação do setor é uma grande saída (existe portaria recente tratando de parte do tema). Tem-se que ter um esclarecimento, discussão, entendimento permanente com o Ministério Público e o Judiciário. Temos discutido como saída, além da Câmara acima, trabalhar com: a) qualificação da demanda (mais especificações ao se fazer qualquer solicitação judicial: informações sobre o paciente, informações do que já foi feito e seus resultados, informações técnicas sobre o que se pretende citando informes técnicos que não sejam exclusivamente do fabricante-comerciante) ; b) escuta do contraditório onde a parte demandada tem chance de apresentar sua versão; c) peritagem específica (inúmeras áreas disponhem de peritagem e a área da saúde, extremamente complexa e controversa, envolvendo milhões de reais, não tem contado com este instrumento; d) finalmente a decisão soberana do judiciário. Isto deve ser o grande investimento preventivo. Duas outras saídas devem ser rediscutidas: a definição de competência por esfera de governo, facilitando a que seja suscitada exatamente a esfera correspondente e a possibilidade legal de se recorrer da decisão judicial, quando considerada injusta pela parte. Tenho sentido que a tese das competências de esferas de governo encontra no MP e no Judiciário uma grande resistência. Trabalha-se com o conceito jurídico amplo de responsabilidade trilateral inteira e igual, quando na prática não é isto que acontece em relação ao financiamento nem ao preceito constitucional. Considerando que a metade dos municípios brasileiros tem menos de 10 mil habitantes (80% menos de 25 mil habitantes!) não conta com pessoal nem técnico nem jurídico com preparo adequado nesta área. Tem sido, em primeiro lugar, esta grande maioria dos pequenos que mais facilmente são suscitados a tomarem providências. Sabidamente, eles não têm nenhuma condição de atender a todas as necessidades de saúde da população já que a integralidade da atenção está ligada à responsabilidade de todas as esferas de governo, mas, cada uma em seu nível de competência.

14.PARTICIPAÇÃO DA COMUNIDADE – Trazer a participação da comunidade do virtual, para o real. Do imaginário para o fático. Participação da comunidade na individualidade do cuidado de saúde. Na humanização do encontro do cidadão com as ações e serviços de saúde. Na visão da dignidade de cada cidadão. De outro lado na participação da comunidade, coletivamente, em sua função propositiva e controladora nos conselhos e conferências de saúde. Propositiva, participando na elaboração e aprovação dos planos de saúde e no controle de sua execução inclusive nos aspectos econômicos e financeiros, acompanhando e fiscalizando o fundo de saúde. Gestores não apenas permitindo ou tolerando conselhos e conferências, mas garantindo sua legitimidade, os meios para que funcione plena e livremente segundo as leis. É necessário que isto seja fato no Brasil inteiro. Duas medidas urgentes deveriam ser tomadas no âmbito federal, pelos que ora assumem o MS: revogar o decreto presidencial que dá poderes ao Ministro da Saúde de escolher entidades e pessoas para serem conselheiros e reformular a resolução 333 com todas suas inconstitucionalidades e ilegalidades. Do pensamento à ação!

E) DESENHO SUMÁRIO DE UMA PROPOSTA DE DESCENTRALIZAÇÃO DO SUS SEGUNDO A LEGISLAÇÃO DISCUTIDA ACIMA, SUPERANDO OS NÓS MOSTRADOS. (TENHO A CERTEZA DE QUE SE DEVA CUMPRIR A LEI, MAS NÃO TENHO NENHUMA CERTEZA DA MANEIRA DE CUMPRI-LA, O QUE MOSTRA A NECESSIDADE DE CONSTRUÍREM-SE PROPOSTAS DEMOCRATICAMENTE DISCUTIDAS ATÉ A EXAUSTÃO) PERMANECE COMO SAÍDA.

1 PREMISSA: descentralização com ênfase na municipalização e com regionalização ascendente.
2 COMANDO TRILATERAL: dirigentes das três esferas de governo – realmente unidos, buscando o consenso, mas, autônomos segundo a CF.
3 COOPERAÇÃO TÉCNICA E FINANCEIRA: estados = maior peso técnico e menor financeiro ; união = maior peso financeiro (é arrecadador de recursos nacionais para as três esferas de governo desempenharem seus papéis constitucionais) e menor técnico.
4 FUNÇÕES: municípios fazem as ações e serviços; estados complementam e suplementam ações e serviços e organizam redes regionalizadas e hierarquizadas; união, excepcionalmente, faz (exceto portos, aeroportos e fronteiras que fazem ou delegam a estados e municípios, mas o fazer é seu)
5. PASSOS:
a. Municípios identificam suas necessidades e as quantificam;
b. Municípios verificam o que podem fazer no seu território através do público estatal (próprio ou de outra esfera de governo) e o que comprarão no universitário, filantrópico e privado lucrativo.
c. Municípios verificam o que tem que buscar fora do seu território municipal na região (micro ou macro) ou no âmbito estadual.
d. Todos os municípios que estão na mesma circunstância, que seguiram os mesmos passos fazem seu plano conjunto regional (micro-macro) ou no âmbito estadual (sempre ascendente).
e. Co-responsabilidade municipal-individual, regional e estadual, sem bloquear os acessos dos pequenos aos grandes, mas sem que os grandes tenham que financiar os pequenos só a partir de seus próprios recursos e sem os pequenos se eximirem de suas responsabilidade apenas se encarregando das transferências de pacientes.
f. Estudo de viabilidade econômica: nem tudo que é necessidade sentida ou não, poderá ser atendido. É necessário fazer um estudo de viabilidade econômica do atendimento a estas necessidades. Qual custo? Qual a disponibilidade dos recursos? Qual a origem dos recursos?
g. O processo de planejamento local, micro, macro e estadual tem que passar por contínua análise de viabilidade econômica tomando-se o partido da compatibilização através do processo de priorização por concomitância.
h. O financiamento será tripartite, federal, estadual e municipal com administração municipal em seu território e com sistema “resseguro-simile” para os procedimentos MACC (médio-alto-custo-complexidade) na dependência da capacidade resolutiva de cada município ou estado. Obs.: Resseguro-simile = um resseguro interno dentro do sistema para que os casos de alto custo não recaiam simplesmente nos per-capitas municipais o que inviabilizaria o ente municipal isoladamente na primeira ocorrência de alto custo.
i. Planos de todos os níveis devem ser aprovados nos conselhos de saúde respectivos. CMS nos municípios. Estaduais na CIB, CES. Nacional na CIT E CNS.
j. Os planos têm que ser compatíveis e serem parte e fazerem parte da PPA, LDO, LOA de cada esfera de governo. Impossível existirem sem estar dentro destas leis.
k. Todos têm que entender a dinâmica : educação/ execução. Ter o conhecimento e ir praticando junto, na mesma hora. Não se tem regras prontas, vamos aprendendo juntos e viabilizando juntos.
l. A relação entre os entes públicos será feita por acordos técnico-financeiros. Sempre entre os próprios, sem tutela ou intermediação espúria. Município a Município, Municípios com os Estados ou com a União.
m. Transferências financeiras de recursos segundo: 8142 (per capita 100%) ou 8080 art.35 ou outra legislação com termo de concerto com ministério público (não pode ser acordo interno de equipe técnica do MS, dos que pensam que podem decidir independentes e não obstante o ditame legal).
n. É urgente discutir tecnicamente o que fazer. É possível cumprir a lei (8080 e 8142)? Se não for, como deverá ser repartido o dinheiro? Qual o melhor critério? Quais os indicadores?
o. Tenho impressão que o critério per capita (o único hoje legal) possa ser um bom critério. Mas não tenho certeza alguma. Estas idéias precisam ser debatidas para que se descubra o melhor caminho para todos. O critério per capita tenta buscar a equidade no momento que atribui a cada cidadão o seu valor igual. O Gestor, de posse deste recurso referente a sua população, diretamente ou como disse pelo resseguro-simile, passa a “comprar” os serviços de saúde de que não dispõe. Processo ascendente, exatamente ao inverso do de hoje. Mas só poderia dar certo na prática com mais recursos e jamais, retirando de uns e transferindo a outros.
p. O que é certo é que o critério de distribuição de recursos nacionais para estados e municípios, mais por simples critério de produção é extremamente iníquo. Cristaliza a injustiça de continuar dando mais a quem mais tem.
q. Repasses de valores globais: base de custos ou base falsa de tabela defasada? Sair da ilusão de que contrato de gestão de per si é economicamente bom, pois se assim fosse o setor privado só fazia suas trocas comerciais por contrato de gestão e não por produto! A indústria compraria seus componentes por contratos globais, os profissionais liberais idem, o comércio idem. No sistema privado de saúde ele capta por valor global, mas compra por produção individual! O contrato de gestão é ótimo para captar recursos e péssimo para remunerar serviços. Dificilmente se consegue o equilíbrio entre serviços e remuneração (a menos que se fizer o cálculo por produção!). Ou se lesa o prestador e leva vantagem o ente pagante, ou sobra dinheiro no prestador e o pagante sai prejudicado.
r. Controle e avaliação: municípios controlam e avaliam seus próprios serviços e os seus contratados-conveniados e o sistema municipal como um todo; estados controlam e avaliam seus próprios serviços e os seus contratados-conveniados e o sistema estadual como um todo; união controla e avalia seus próprios serviços e os seus contratados-conveniados e o sistema nacional como um todo. E os tribunais de contas avaliam e controlam, externamente, os entes federados. Sem se esquecer que os conselhos de saúde também devem acompanhar e fiscalizar a execução dos planos de saúde em suas esferas de governo.

Ainda que pareça tudo igualzinho aos atuais instrumentos PPI, PDR, PRI, Agenda, Quadro de Metas etc, não é. Aparentemente tudo igual, mas na raiz os mesmos instrumentos, transmudados para o modelo PPA, LDO, LOA, podem ser concretizados de maneira totalmente diferente em processo e conteúdo. E, espera-se, com melhores resultados. E, essencialmente, de acordo com a lei.

F) CONCLUINDO
Quantas vezes já discutimos tudo isto?!!! Quantas vezes já fizemos juras de que isto aconteceria?!!! Não me envergonho ... ainda uma vez.
Podemos sintetizar as saídas já expressas acima:
• Não é começo e não existe terra arrasada, muito pelo contrário. Muito foi e continua sendo feito Brasil afora.
• Tenho certeza absoluta: mais já fizemos do que o que resta a fazer
• Estamos todos construindo como cidadãos independentes da “facção” em que militemos, permanente ou transitoriamente.
• Estamos avançando sempre (estou nisto há 43 anos e só de médico 32!) Nosso grande problema é a velocidade. Nem sempre somos ligeiros para acompanhar o tempo e compensar o defasado de antes. Mesmo avançando, temos perdido a corrida do tempo a seu tempo e muito menos temos conseguido recuperar o tempo perdido no passado.
• Não temos muito a inventar. Não são novos pactos de definições e re-explicações de termos. São compromissos de se cumprir a lei e acertar o operacional delas.
• Tomar medidas gerais que vão resolver inúmeros problemas menores e dependentes de soluções de maior amplitude. Acima estão apontadas.

Mais uma vez estamos diante do recomeço. Que seja a continuidade do certo, a correção do errado e o enfrentamento racional do novo.
O desafio está posto.
Devemos todos estar a postos no seu enfrentamento: cada um fazendo sua parte, pequena que seja, na garantia da saúde e felicidade das pessoas.



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