QUE PROPÕE A GESTÃO ESTADUAL DOS SERVIÇOS DE SAÚDE REGIONAIS
1. PL 4598/2004 do Dep. Nazareno Fonteles – PT-PI “PL 4598/2004 - Do Sr. Nazareno Fonteles Altera a Lei n.º 8.080, de 19 de setembro de 1990, acrescentando-lhe parágrafo que dispõe sobre a gestão de ações e serviços de saúde que caracterizam-se como de referência estadual ou regional.
O Congresso Nacional decreta: Art. 1º O art. 17 da Lei n.º 8.080, de 19 de setembro de 1990, passa a vigorar acrescido dos seguintes parágrafos: “Art. 17 § 1º A gestão dos hospitais ou outros estabelecimentos públicos de saúde ou órgãos públicos que servem de referência estadual ou regional, executando ações de atenção à saúde que atendam ou atinjam às populações fora dos limites do município onde se situam, é de competência da direção estadual do Sistema Único de Saúde. § 2º A gestão referida no parágrafo anterior inclui a administração orçamentária e financeira dos estabelecimentos e órgãos de referência, para onde devem ser alocadas as respectivas transferências de recursos por parte do gestor federal do SUS. § 3º Estão incluídos entre os órgãos e estabelecimentos públicos referidos no parágrafo primeiro, aqueles que exercem funções de promoção, prevenção, cura e reabilitação da saúde, a exemplo da vigilância epidemiológica, da vigilância sanitária e vigilância ambiental, e clínicas e hospitais de média e alta complexidade.” Art. 2º Esta lei entra em vigor na data da sua publicação.
2. JUSTIFICAÇÃO APRESENTADA PELO DEPUTADO NAZARENO A Lei n.º 8.080, de 1990, chamada de Lei Orgânica da Saúde, estabelece que as ações e serviços de saúde, executados pelo SUS, seja diretamente ou mediante participação complementar da iniciativa privada, serão organizados de forma regionalizada e hierarquizada em níveis de complexidade crescente (art. 8º). Ao definir as competências e atribuições de cada esfera de governo – federal, estadual e municipal – a mesma Lei, em seu art. 17, inciso IX, prescreve ao gestor estadual a competência de “identificar estabelecimentos hospitalares de referência e gerir sistemas públicos de alta complexidade, de referência estadual e regional.” Entretanto, a experiência tem demonstrado que há um espaço obscuro na gestão do SUS quando estabelecimentos hospitalares e ambulatoriais, apesar de estarem no território municipal, prestam serviços e atendem à população de todo o estado ou de uma região plurimunicipal. Geralmente são hospitais sediados nas capitais e cidades maiores cujos gestores, ao receberem a condição de Gestão Plena do Sistema Municipal de Saúde, passam a administrar todos os serviços municipais e receberem as respectivas transferências financeiras. Acontece que o gestor municipal tem seu compromisso voltado ao atendimento da população da sua jurisdição. É o gestor estadual o responsável por questões que transcendem à jurisdição municipal, pelo atendimento de referência aos pacientes que, pela própria limitação do sistema de saúde do município onde moram, recorrem aos serviços mais complexos existentes na capital do estado ou em cidades maiores. Surtos e epidemias, por exemplo, quando extrapolam as fronteiras municipais, devem ser tratados pelo dirigente estadual que, para bem desempenhar esta função, deve ser o gestor dos serviços de referência. Ações de fiscalização sanitária, como outro exemplo, não poderiam ser deixadas sob exclusiva competência do gestor municipal, pois os esquemas paroquiais de poder inviabilizam qualquer ação mais firme e penalizadora aos infratores da legislação sanitária. O processo de descentralização do SUS não é um fim em si mesmo, antes, é um meio para que o Sistema atinja a todos os cidadãos onde quer que eles se encontrem, de forma a cumprir o mandamento constitucional da acessibilidade universal. Nesse contexto, a competência do gestor estadual deve ser melhor definida, especialmente quando estão em jogo ações e serviços que atendem cidadãos de municípios de todo o estado ou de uma região plurimunicipal. O gestor estadual é quem deve ter a competência para planejar, organizar, administrar e executar tais serviços e ações, pois é esse nível de governo que detém a visão geral de toda a realidade sanitária regional. Além disso, a representatividade do Conselho Estadual de Saúde, assim como do Legislativo e Executivo estaduais, atinge todos os municípios do estado, o que não ocorre com o Conselho Municipal de Saúde e o Legislativo e Executivo municipais, que representam apenas os seus munícipes. Ademais, os custos aumentam exponencialmente com a implantação dos serviços complexos em nível municipal, fator este que demonstra a significativa importância da regionalização. Entendemos, perfeitamente, que o nível municipal deve ser o executor por excelência dos serviços de saúde. Porém, a organização hierarquizada do SUS exige o equacionamento de questões que não se enquadram em uma interpretação reducionista do processo de descentralização. Pequenos em sua grande maioria, os municípios não têm estrutura para exercer, com plenitude de recursos e de poder político, todas as ações e serviços imprescindíveis à promoção da saúde e à prevenção ou tratamento dos principais problemas sanitários do estado.
Qualquer população, em qualquer lugar do nosso País, tem o direito à atenção integral, ou seja, à cobertura de todos os seus problemas de saúde, inclusive às ações de promoção ou prevenção. O gestor estadual deve ter maior responsabilidade e instrumentos para que esta garantia constitucional se concretize na prática. Entendemos que a clara definição dessas competências irá proporcionar maior eficácia e economia ao SUS. A lei servirá de fundamento para que as comissões intergestoras – as bipartites e a tripartite - trabalhem no sentido de que as unidades federadas alcancem, de forma pactuada, a melhor organização para os sistemas estaduais e municipais de saúde. Oferecemos este projeto de lei para sanar estes espaços não definidos da organização e gestão do SUS e para que o Sistema tenha aperfeiçoados os seus instrumentos de descentralização, na busca de maior eficácia ao atendimento de todos os brasileiros. Por estes motivos, esperamos o apoio de nossos ilustres colegas, Deputados desta Casa, para sua aprovação.
NAZARENO FONTELES - Deputado Federal/PT/PI
3. COMENTÁRIOS DE GILSON CARVALHO O PL 4598 – pretende alterar a Lei 8080 acrescendo três novos parágrafos no artigo 17 que descreve as competências dos Estados no Sistema Único de Saúde.
3.1 SUBSTRATO LEGAL Inicialmente levanto os substratos legais que fundamentam meus comentários: •
CONSTITUIÇÃO FEDERAL – Art.30,VII “ Compete aos Municípios:... prestar com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, serviços de atendimento à saúde da população.” •
CONSTITUIÇÃO FEDERAL – Art.198, I “As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes: - I descentralização, com direção única em cada esfera de governo” •
LEI 8080 – Art.7 “As ações e serviços públicos de saúde e de serviços privados contratados ou conveniados que integram o SUS são desenvolvidos de acordo com as diretrizes previstas no art.198 da CF obedecendo ainda os seguintes princípios: ...IX descentralização político administrativa, com direção única em cada esfera de governo: ênfase na descentralização dos serviços para os municípios; regionalização e hierarquização da rede de serviços de saúde;” •
LEI 8080 – Art. 16 “À Direção Nacional do SUS compete: ... XV promover a descentralização para as Unidades Federadas e para os Municípios, dos serviços e ações de saúde, respectivamente, de abrangência estadual e municipal”; •
LEI 8080 - Art. 17, I “À Direção Estadual do SUS compete:... I- Promover a descentralização para os Municípios dos serviços e ações de saúde” •
LEI 8080 – Art., 18, “À Direção Municipal do SUS compete: ... I – planejar, organizar, controlar e avaliar as ações e os serviços de saúde e gerir e executar os serviços públicos de saúde;” •
LEI 8689 – Art.4º §2 “Os serviços de assistência à saúde ainda sob a responsabilidade do INAMPS serão prestadas por municípios e estados, conforme a respectiva competência definida na Lei 8080, podendo ser executados, em caráter supletivo e transitório, pela União em relação às esferas estaduais e municipal, e pelo Estado, em relação à esfera municipal.”
3.2 ANÁLISES DETALHADA DO PL 4598
3.2.1. A INCONSTITUCIONALIDADE É O ARGUMENTO CONTRA ESTE PL QUE , POR SI SÓ, É ÚNICO E SUFICIENTE PARA QUE NÃO SEJA APROVADO NEM NAS COMISSÕES NEM NO PLENÁRIO.
O PL: O OBJETIVO DO PL É PASSAR À ADMINISTRAÇÃO ESTADUAL UNIDADES DE SAÚDE (TODAS) QUE ATENDAM POPULAÇÕES DE MAIS DE UM MUNICÍPIO, COM ADMINISTRAÇÃO ORÇAMENTÁRIA E FINANCEIRA E COM DIREITO DE RECEBER TRANSFERÊNCIAS FEDERAIS.
A INCONSTITUCIONALIDADE DO PL:
CONSTITUIÇÃO FEDERAL – Art.198, I “As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes: - I descentralização, com direção única em cada esfera de governo” O PL comete a INCONSTITUCIONALIDADE ao romper com a diretriz constitucional do Art.198 que coloca a DIRETRIZ
DESCENTRALIZAÇÃO COM DIREÇÃO ÚNICA EM CADA ESFERA DE GOVERNO.
Descentralizar inclui a transferência constitucional de ações e serviços federais para estados e municípios e de estaduais para municípios. Direção Única em cada esfera de governo implica que os serviços de saúde no âmbito e território dos municípios só podem ser dirigidos por eles, ainda que possam ser administrados (gerência operacional) pelos estados ou pela União, a autoridade sanitária deve ser o município. Portando, estando estes no exercício do preceito constitucional de gestão plena de todo o sistema de saúde no município não se poderia ter serviços de saúde que não estivessem sob a Direção Única do Município.
3.2.2 CO-ARGUMENTOS QUE SERIAM TOTALMENTE DESNECESSÁRIOS DIANTE DO ACIMA, MAS QUE CITO:
O PL quebra o comando constitucional do Art.30,VII onde aos municípios é facultada a competência de prestar serviços de assistência à saúde e aos estados e à União de garantir cooperação técnica e financeira. Da maneira como estão redigidos os vários parágrafos eles têm um erro fundamental gravíssimo. Eles tratam de TODOS OS HOSPITAIS, AMBULATÓRIOS, SERVIÇOS DE EMERGÊNCIA , VIGILÂNCIA SANITÁRIA EPIDEMIOLÓGICA ETC. QUE ATENDAM OU ATINJAM ÀS POPULAÇÕES FORA DOS LIMITES DO MUNICÍPIO ONDE SE SITUAM. Isto quer dizer que as milhares de unidades de saúde dos municípios que hoje atendem – dentro ou fora da PPI – aos cidadãos de municípios vizinhos, de agora em diante, deverão ser repassadas para a competência das Secretarias Estaduais de Saúde. Estas unidades de saúde, que são próprias dos municípios, se não puderem atender à população de cidades vizinhas (pois, automaticamente, por este PL do Nazareno, passariam à gestão dos Estados) só têm um caminho a seguir: não atender ninguém de outro município. Caso contrário por este PL serão “sequestrados” pelas Secretarias Estaduais de Saúde. Existem municípios pequenos que hoje administram a única ou as poucas unidades de saúde localizadas em seu município e que são unidades estaduais (construídas e até antes do SUS diretamente administradas pelos Estados). Estas unidades atendem munícipes de cidades vizinhas. Por este PL estas unidades de saúde voltam à administração dos Estados. Existem Hospitais da União (como os do RIO) – o que sabemos já deveriam estar nas mãos das outras esferas de governo – que atendem população de várias cidades. Por este PL estas unidades de saúde serão OBRIGATORIAMENTE administradas pelos Estados, mesmo as que já estão sendo administradas e bem, por algum município. Existem Unidades de Saúde e Hospitais de propriedade dos Estados que há anos estão sob a responsabilidade (gestão-gerência) dos municípios e atendem eminentemente população do próprio município sede e, em menor proporção, atendem munícipes de outros municípios. Estas, pelo PL voltam à administração dos Estados.