Em 5 de maio saiu a PT-MS/GM 1034, inimaginavelmente assinada pelo Ministro Temporão. Uma entre centenas de assinaturas da rotina burocrática, que, se chanceladas inadvertidamente podem tisnar sua imagem de cidadão e sua história na área da saúde.
Faltou vigilância a sua volta. Todo governante deveria ter a seu lado um chato-crica, excessiva e propositadamente fazendo o papel do contraditório. O bobo da corte ao contrário. O vigilante da corte!
Infelizmente, o ao redor, é ocupado, muito comumente, por incapazes de alertar o ocupante do poder da legalidade, gravidade, temeridade e riscos de assumir determinadas posições. Medo de contrariar? Falta de senso crítico? Deslumbre de estar, transitoriamente, agarrado no contra pé do poder?
Serei breve na análise da PT-MS/GM 1034, pela urgência de fazê-lo. São dois os pontos cruciais: o cerceamento da informação e do direito ao controle pelo cidadão na saúde (um dos braços da participação da comunidade) e o libera geral, num momento crucial, oficializando os contratos de gestão com as Organizações Sociais.
A reação à introdução da possibilidade de contratos de gestão com Organizações Sociais dentro do SUS foi tão pronta, até na grande mídia, que menos de duas semanas depois de publicada foi retificada a portaria 1034 retirando esta questão Não sei se foi descoberto o autor desta façanha e que argumentos usou para justificar-se pelo “engano” involuntário que contraria parecer da Assessoria Jurídica do MS e Resoluções do CNS. É a segunda vez em que este “engano” foi cometido. Por reação imediata da vez anterior também se retificou a portaria. Por que razão, por duas vezes, alguém introduz esta questão dos contratos de gestão com Organizações Sociais, por engano e sem querer?!!!
A outra questão é mais grave e séria pois, diz respeito ao cerceamento do direito à informação dos cidadãos e seu dever de controlar ações e serviços de saúde. O direito à informação de alta, agora suspenso, é essencial à saúde do cidadão. Vejamos.
PT-MS/GM 1034 5/5/2010 revoga a PT-MS/GM 3277 de 22/12/2006. Olhem bem, abaixo, o que mudou.
PT-MS-3277 22/DEZ/2006
PT-MS-1034 5/MAIO/2010
ASSINADA PELO MINISTRO JOSÉ AGENOR
ASSINADA PELO MINISTRO TEMPORÃO
REVOGADA PELA NOVA PORTARIA 1034
NOVA PORTARIA QUE REVOGA A 3277
Art. 8º São cláusulas necessárias nos contratos e convênios firmados entre a administração pública e o setor privado, lucrativo, sem fins lucrativos e filantrópicos, as que exijam das entidades contratadas ou conveniadas a observância das seguintes condições:
Art. 8º As instituições privadas de assistência à saúde contratadas ou conveniadas com o SUS devem atender às seguintes condições:
I - manter registro atualizado no Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde - CNES
II - submeter-se a avaliações sistemáticas, de acordo com o Programa Nacional de Avaliação de Serviços de Saúde - PNASS
III - submeter-se à regulação instituída pelo gestor
IV - obrigar-se a entregar ao usuário ou ao seu responsável, no ato da saída do estabelecimento, documento de histórico do atendimento prestado ou resumo de alta, onde conste, também, a inscrição “Esta conta foi paga com recursos públicos provenientes de seus impostos e contribuições sociais”
REVOGADO
V - obrigar-se a apresentar, sempre que solicitado, relatórios de atividades que demonstrem, quantitativa e qualitativamente, o atendimento do objeto
IV - obrigar-se a apresentar, sempre que solicitado, relatórios de atividade que demonstrem, quantitativa e qualitativamente, o atendimento do objeto
VI - manter contrato de trabalho que assegure direitos trabalhistas, sociais e previdenciários aos seus trabalhadores e prestadores de serviços
REVOGADO
VII - garantir o acesso dos conselhos de saúde aos serviços contratados no exercício de seu poder de fiscalização e
REVOGADO
VIII - cumprir as diretrizes da Política Nacional de Humanização - PNH.
V - atender as diretrizes da Política Nacional de Humanização – PNH
VI - submeter-se ao Controle Nacional de Auditoria - SNA, no âmbito do SUS, apresentando toda documentação necessária, desde que solicitado.
Na portaria 1034 suprimem-se questões essenciais:
1.CANCELADO: “IV - obrigar-se a entregar ao usuário ou ao seu responsável, no ato da saída do estabelecimento, documento de histórico do atendimento prestado ou resumo de alta, onde conste, também, a inscrição “Esta conta foi paga com recursos públicos provenientes de seus impostos e contribuições sociais”
COMENTÁRIO: Esta construção surge na equipe dirigente do Ministério da Saúde no ano de 1993, à qual me orgulho de ter pertencido. A determinação era tanta em garantir este direito ao cidadão que na negociação com o setor privado se conseguiu emplacar esta cláusula na portaria específica das cláusulas essenciais a convênios e contratos.
Mais tarde, sendo Serra Ministro da Saúde retirou-se este direito cancelando portaria específica com a exigência. Nova luta e em 2006 conseguiu-se manter a cláusula do direito à informação com o informe de alta.
Agora a PT-MS/GM 1034 TIRA ESTE DIREITO À INFORMAÇÃO DO CIDADÃO.
2.CANCELADO: “VI - manter contrato de trabalho que assegure direitos trabalhistas, sociais e previdenciários aos seus trabalhadores e prestadores de serviços;”
COMENTÁRIO: Podem dizer da inocuidade deste inciso pois a lei é suficientemente clara para garantir direitos trabalhistas, sociais e previdenciários da força de trabalho do contratado. Nada contra mais um lembrete num contrato entre duas partes numa área crucial cheia de problemas como a de RH.
3.CANCELADO: “VII - garantir o acesso dos conselhos de saúde aos serviços contratados no exercício de seu poder de fiscalização e”
COMENTÁRIO: Todos os conselhos de saúde devem ter acesso aos serviços contratados para fiscalizá-los. Claro que o setor privado lucrativo e não lucrativo quando prestando serviços ao SUS de forma complementar assume o caráter SUS, como está na Lei 8080, portanto sujeito ao controle dos conselhos. Esta cláusula é fundamental para evitar o que vem acontecendo com entidades contratadas-conveniadas que se recusam a permitir a fiscalização pelos Conselhos de Saúde.
CONCLUSÃO:
O MAL ESTÁ FEITO E PRECISA SER REMEDIADO. ISTO PREOCUPA-ME MUITO. TEMOS FICADO NA PERIFERIA DE INÚMEROS PROBLEMAS E NÃO SOMOS EFETIVOS NAS PROVIDÊNCIAS PARA REPUDIÁ-LOS E TENTAR CORRIGÍ-LOS.
O QUE ACONTECEU NESTAS SEMANAS APÓS ESTA MALFADADA PORTARIA? A GRAVIDADE DESTAS REVOGAÇÕES NÃO TEVE A INDIGNAÇÃO DOS CIDADÃOS E DOS CONSELHEIROS QUE DEVERIAM ESTAR ATENTOS EM ESTADO DE VIGILÂNCIA PERMANENTE. ONDE ESTAVAM AQUELES COM O MÚNUS DE IDENTIFICAR E MOSTRAR ESTAS QUESTÕES AOS CONSELHEIROS?
PERGUNTO: AS MESAS DIRETORAS DOS CONSELHOS JÁ FIZERAM QUANTAS REUNIÕES EMERGENCIAIS PARA DISCUTIR ESTA QUESTÃO? QUANTOS PONTOS E TEMPO DE PAUTA PARA DISCUTIR ESTA QUESTÃO, NOS CONSELHOS NACIONAL, ESTADUAIS E MUNICIPAIS DE SAÚDE? PASSEATAS? CONVOCAÇÃO COM PASSAGENS E DIÁRIAS PAGAS PARA CONSELHEIROS DO BRASIL INTEIRO PROTESTAREM EM BRASILIA? QUANTOS PANFLETOS FORAM FEITOS? BOTONS? ADESIVOS? CAMISETAS? BOLSAS COM MATERIAL? ARTIGOS EM JORNAIS DE GRANDE CIRCULAÇÃO?
NÃO SE TRATA DE UMA AMEAÇA, MAS DE FATO CONSUMADO E LEGALIZADO! ESTOU AGUARDANDO UMA AÇÃO EFETIVA! A REAÇÃO EM RELAÇÃO ÀS ORGANIZAÇÕES SOCIAIS FEZ COM QUE O MINISTÉRIO DA SAÚDE REVOGASSE DA PORTARIA A PARTE REFERENTE ÀS ORGANIZAÇÕES SOCIAIS.
ENTRETANTO, NA MESMA PORTARIA PERMANECEU O TEXTO QUE CERCEIA O DIREITO À INFORMAÇÃO E O PODER FISCALIZADOR DOS CONSELHOS NOS SERVIÇOS PRIVADOS CONTRATADOS E CONVENIADOS. PIOR: SEM A REPERCUSSÃO E NEM MESMO A INDIGNAÇÃO DE CONSELHEIROS E DE NÓS CIDADÃOS-USUÁRIOS DOS SERVIÇOS DE SAÚDE.
NA PRIMEIRA NOITE PISAM NAS FLORES...
ANEXO