Os serviços de saúde, entre outras funções, devem estabelecer, no plano de saúde, como um de seus objetivos prioritários, a discussão e prática de ações que busquem vigiar a implantação, a execução, a manutenção e a recuperação da qualidade de vida dos cidadãos da qual faz parte integrante a qualidade de saúde. Para tanto devem ser buscadas providências práticas de todos os setores, intra e inter institucionais, que possam ter parte desta responsabilidade e que nunca será, exclusivamente, o setor saúde. O nível local é o lócus onde, mais efetiva e eficazmente. pode se dar este processo. A proximidade entre as necessidades e o poder permite, quase que com privilegiamento, desenvolver esta horizontalidade de intervenção partilhada com os demais setores locais envolvidos. Eis aí o desafio.
Na maioria das vezes a qualidade de vida, comumente é tomada já qualificada: A BOA QUALIDADE DE VIDA. Dentro deste conceito amplo não pode deixar de estar a SAÚDE. Não se fala em qualidade de vida sem pressupor a saúde como seu componente essencial. E, aqui, mais do que nunca, tome-se saúde em seu conceito o mais abrangente que não diz respeito apenas à simples ausência de doença, mas sim a toda uma concepção mais ampla incluindo o bem estar do físico, social e mental. Aquela mesma, sempre criticada, por considerada inatingível, que foi colocada pela Organização Mundial de Saúde.
Portanto, a busca da Saúde e o desejo, traduzido em atos, de fazê-la acontecer, são parte de uma busca maior que é a de garantirmos boa qualidade de vida. Saúde é apenas um de seus componentes, ainda que, sem dúvida, o mais importante deles.
A qualidade de vida é um condição essencial a ser garantida aos que sobrevivemos. Todos aqueles que sobramos, que não nos tivemos roubada a vida através dos inúmeros agravos a que já fomos submetidos como a todos os demais membros da sociedade. A mortalidade infantil foi um deles. Ainda que, em termos médios, no Brasil se diga que, para cada 1000 que nascem a cada ano cerca de 20 morrem antes de completar um ano de vida, isto apenas sofre as distorções da média principalmente quando os números se mostram díspares demais. Nos bolsões de pobreza da periferia dos grandes centros e nas regiões mais pobres, pois mais sujeitas à iniquidade da partição desigual de rendas de nosso país, este coeficiente de mortalidade infantil (em menor de l ano) chega ao absurdo de representar três quatro vezes mais que a menor que oscila por 10/1000.
Evitar as mortes, principalmente as preveníveis por algum recurso de fácil aplicabilidade e de baixo custo, não é suficiente. Isto é agravado, máxime quando as condições de viva dos sobreviventes serão as piores possíveis: sem emprego, sem renda, sem casa, sem comida, sem educação, sem transporte, sem lazer etc. etc. Enfim, pertencentes à grande massa dos excluídos. Sobreviver para se ter, a seguir, mais um excluído é uma tremenda perversidade!!! A solução, entretanto não é omitir-se diante da interrupção da vida, nem tão pouco não garantí-la, mas trabalhar duro para que os sobreviventes vivam com o mínimo de dignidade possível.
Aqui temos a chave que pode mudar o modelo de se abordar a saúde das pessoas. Até agora o modelo de atenção à saúde foi voltado para a doença, no velho sistema de “ir atrás do prejuízo”. Ao se enfocar outro objetivo mais amplo, vamos ter que mudar a lógica de nossa prática de fazer saúde.
Se temos, como novo objetivo estabelecido, cuidar da conquista da qualidade de vida e saúde devemos promover uma revolução nos serviços de saúde como um todo. Sabidamente todos que “cuidaram do leite derramado, pouco tempo e recurso lhes sobrou para ver como não se derrama mais o leite”. Todos que somos pressionados por todos para dar conta da demanda real e da induzida por interesses econômico-financeiros. Temos que trabalhar tanto no atendimento das doenças como na sua prevenção no aspecto mais amplo, aquele que envolve ações não somente do setor saúde mas de vários outros setores como obras, serviços, educação, meio ambiente, cultura, transporte, lazer etc. etc.
Abrir-se à idéia de que a conquista da qualidade de vida e saúde não pode ser obra de um setor só. Na lei orgânica de saúde, 80080/90, já se diz, bem claramente, que saúde se faz com a participação do indivíduo, da familia, das empresas e da sociedade.
Levar esta idéia às últimas consequências práticas: envolver os órgãos públicos de todos os setores, envolver as instituições filantrópicas, não governamentais, envolver as pessoas... todos com o objetivo único de estar trabalhando na construção da qualidade de vida e saúde.
A qualidade de vida e saúde tem que ser conquistada com toda a garra. Ela é obra dos serviços de saúde, mas não só deles. As outras áreas têm responsabilidade igual senão maior na conquista destes objetivos. O que se faz necessário é estar aberto para praticar a intersetorialidade com o público e com a sociedade organizada ou não.
De outro lado, será através da descentralização da gestão que se efetivará melhor a relação entre as partes envolvidas dentro do principio da horizontariedade, bem mais efetivo do que da verticalidade. Praticar intersetorialidade é muito mais fácil a nível horizontal.
O essencial é querer. Ter vontade política. Começar a construir a saúde da população através da idéia ferrenha de fazer de tudo isto a própria busca contínua do homem pela felicidade.