Este é um resumo executivo de inicio de outubro de 2009 para situar o estado da arte da votação da regulamentação da EC-29 pelo Congresso Nacional. A Regulamentação da EC-29 busca uma definição de mais recursos federais para a saúde desde 2003...
1.OS ANTECEDENTES MAIS REMOTOS DO FINANCIAMENTO PÚBLICO DA SAÚDE
· Os Constituintes Economistas vetaram que CF de 1988 fixasse um percentual de recursos da seguridade para a saúde. A CF definiu que o financiamento seria responsabilidade das três esferas de governo. Definiu apenas que no ano de 1989, para não haver lacuna, A União devesse alocar para a saúde 30% da Seguridade Social e nos anos seguintes a Lei de Diretrizes Orçamentárias definiria o montante de recursos federais para a saúde. Entre 1990 e 1993 a LDO repetiu a definição dos 30% da OSS o que nunca foi cumprido, tendo a média destes anos ficado em apenas 20%.
· Em maio de 1993 a saúde passou a perder 250 milhões de dólares mês quando, por conta e risco próprios, Antônio Brito, Ministro da Previdência, deixou de repassar os recursos do INAMPS para o Ministério da Saúde. O MS recebeu o INAMPS com todas suas despesas mas, por uma medida arbitrária e sem respaldo legal do Ministro Brito da Previdência, ficou sem os recursos financeiros do INAMPS!!!
· Eduardo Jorge, médico, deputado paulista pelo PT e outros fizeram em maio de 1993, uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC-169) para estabelecer na CF recursos definidos, definitivos e suficientes para a saúde. A PEC definia que a UNIÃO deveria alocar para a saúde no mínimo 30% do Orçamento da Seguridade Social. Além disto, União, Estados e Municípios deveriam alocar para a saúde no mínimo 10% de sua receita fiscal. Aprovado em todas comissões nunca ia a plenário pois nunca teve chance de ser votado e aprovado.
· Serra em 2000, Ministro da Saúde, pensou diferente de como pensava quando Deputado Constituinte e da área econômica. Antes, defendia que a saúde não devia ter um dinheiro carimbado para ela. Mas, uma vez Ministro, sentindo a falta de recursos para a saúde defendeu que se colocasse em votação a proposta da PEC-169.
· Entretanto, Serra, Malan e FHC modificaram radicalmente a PEC-169. Mudaram a forma de cálculo dos valores devidos para a União, de modo que não se aumentasse absolutamente nada da União, mas que crescesse a participação dos Estados de 10 para 12% (aumento de 20% a mais que a proposta da PEC-169!) e dos Municípios de 10 para 15% (aumento de 50% a mais que a proposta da PEC-169) de seus impostos. Em 1999 foi o maior valor de recursos da União por habitante: nunca mais o Ministério da Saúde repetiu aquele valor. Se aprovada a PEC 169, proposta do Eduardo Jorge, hoje o MS estaria gastando 3 vezes mais do que gasta. População e técnicos continuaram apoiando a PEC 169, pensando que ela é que estava em votação, mas na verdade era seu arremedo: reduzia a 1/3 a participação da União e elevava em 20% a participação dos Estados e em 50% a dos municípios.
· Em setembro de 2000, finalmente foi votada a PEC 169, que transformou-se na Emenda Constitucional 29 (EC-29) definindo o mínimo de cada esfera de Governo. Desde então a União deve aplicar o mesmo empenhado no ano anterior, corrigido pela variação nominal do PIB entre os 2 anos anteriores. Estados, 12% de seus impostos e Municípios 15% de seus impostos.
· A EC-29 fez outras definições como a Constitucionalização do Fundo e da missão do Conselho de Saúde; a atribuição de no mínimo 15% dos recursos federais per capita para a atenção básica; penalidade de intervenção e suspensão de recursos para quem não cumprisse o mínimo; determinação para que a cada cinco anos se regulamentasse seu teor, em relação aos percentuais devidos à saúde, pela União, Estados e Municípios. Se não houvesse regulamentação neste período, permaneceria a mesma sistemática de cálculo, que é o que acontece até hoje.
2. OS ANTECEDENTES MAIS ATUAIS DO FINANCIAMENTO PÚBLICO DA SAÚDE
· Desde 2003 tramita no Câmara Federal o PLP 01-2003 do Dep. Roberto Gouveia com o intuito de fazer a regulamentação prevista na EC-29. Este PLP foi aprovado na Câmara e remetido ao Senado, mas como ele foi aprovado contando com os recursos da CPMF e foi reprovada no Senado, ele deixou de ser viável. O projeto inicial de se alocar 10% da Receita Corrente Bruta da União para a saúde foi adulterado na undécima hora, como a aprovação da Câmara, onde se manteve a mesma forma de cálculo anterior e contando-se com a CPMF.
· Desde 2007 tramita no Senado Federal o PLS 121 do Senador Tião Viana que manteve os mesmos percentuais de recursos próprios de Estados e Municípios e para a União, 10% da Receita Corrente Bruta escalonado em 4 anos (8,5; 9; 9,5; 10). A CPMF já havia sido reprovada no SENADO (final de 2007) e mesmo assim, o Senado não criou outra fonte de recursos. O Projeto aprovado no Senado, de acordo com o projeto original de Gouveia, com decisão das entidades de saúde e da XIII Conferência Nacional de Saúde foi encaminhado à Câmara.
· Ambos projetos são divergentes na questão do financiamento, tanto no montante como na forma de cálculo. Têm, em comum, a redefinição, de forma inequívoca, do que são e o que não são ações de saúde; mais mecanismos de transparência e visibilidade na administração pública de saúde e critérios de transferência federais para estados e municípios e de estados para municípios. O Projeto da Câmara com mais detalhes e o Projeto do Senado, mais sucinto.
· Ao receber o Projeto aprovado pelo Senado a Câmara apresentou um substitutivo global, voltando a proposta de manter a atual forma de cálculo dos recursos (recurso empenhado no ano anterior, aplicada a variação nominal do PIB entre os dois últimos anos anteriores). Resgatou a CPMF agora como CSS – Contribuição Social para a Saúde nos moldes da CPMF só que na alíquota de 0,10 % e não mais dos 0,38%.
· Este projeto foi votado no primeiro semestre de 2008 ficando apenas na dependência da votação de um destaque. Se este destaque permanecer e não for derrubado, o projeto da Câmara fica sem valor pois, inviabiliza a criação da CSS. Sem CSS retorna-se à situação atual sem nenhum acréscimo de dinheiro para a saúde e com uma perda de R$6 bi do dinheiro do FUNDEB que está retirado da base dos Estados para efeito de cálculo do percentual da saúde. Se derrubado o destaque o projeto da Câmara cria a CSS para a Saúde.
3.PRÓXIMOS PASSOS A PARTIR DE OUTUBRO DE 2009.
· Foi aprovado no Senado o PLS 121 capaz de aumentar os recursos da saúde em cerca de R$ 71 bi em 4 anos. (SEM DESCONTO DE DRU)
· Existe na Câmara o PLP 308, substitutivo ao projeto do Senado e que cria a CSS e aumentando cerca de R$ 31 bi em 4 anos. (SEM DESCONTO DE DRU E SEM PERDA FUNDEB)
· Aprovado na Câmara, com ou sem CSS, irá ao Senado.
· O Senado ao receber o Projeto da Câmara pode assumir as seguintes posições:
a) MANTER O SEU PROJETO DE SENADO NA ÍNTEGRA O QUE SÓ PODE ACONTECER SE O SENADO REJEITAR O PROJETO DA CÂMARA.
b) APROVAR O PROJETO DA CÂMARA NA ÍNTEGRA O QUE SIGNIFICA, AUTOMATICAMENTE, REJEITAR O ORIGINAL DO SENADO ENCAMINHADO À CÂMARA.
c) APROVAR O PROJETO DA CÂMARA APENAS RETIRANDO UM OU MAIS DE SEUS ARTIGOS DESDE QUE MANTIDA A COERÊNCIA.
d) MESCLAR OS DOIS PROJETOS ARTIGO A ARTIGO (SEM NOVA REDAÇÃO) DESDE QUE MANTIDA A COERÊNCIA.
OBS: EM QUALQUER HIPÓTESE DESTAS PODEM SER FEITAS PEQUENAS MODIFICAÇÕES, APENAS REDACIONAIS, PARA DEIXAR O TEXTO MAIS CLARO SEMPRE SEM PREJUÍZO OU MODIFICAÇÃO DO TEOR APROVADO
· O projeto substitutivo está esperando a rejeição ou manutenção de um último destaque na Câmara. O texto já aprovado não está mais aberto a nenhuma outra exclusão ou introdução de artigos, destaques ou emendas. Por exemplo, não se pode mudar a sangria de R$6 bi do financiamento estadual para a saúde. Deputados já aprovaram neste projeto que os recursos referentes ao FUNDEB – Fundo para a Educação Básica não serão contabilizados como base para cálculo do montante da saúde. São cerca de 50 bi que serão excluídos da base de definição dos 12% para a saúde. Imaginem a situação esquizofrênica onde nos metemos: Hoje os Estados devedores de alguns bilhões a cada ano, desde 2000, para financiamento da saúde, serão “anistiados” e passarão a ser credores, podendo baixar seus gastos com saúde, sem descumprir a EC-29, agora com nova regulamentação, que lhes favorece. A Saúde, pega de surpresa, foi incapaz de impedir que esta manobra se concretizasse desencadeada por governadores e sacramentada pelos deputados.
· A estimativa de arrecadação da CSS, se criada, é de cerca de R$12,5 bi. Destes R12,5 bi, já se tem que subtrair 20% da DRU o que significa R$2,5 bi a menos. Sobram R$10 bi. Estes R$10 bi vão cobrir, já de pronto, os R$6 bi a menos referentes à perda do FUNDEB dos Estados. Efetivamente a nova CSS – Contribuição Social para a Saúde significará apenas R$4 bi a mais para a saúde. De uma arrecadação de R$ 12,5 bi da CSS o Governo Federal ficará com o ágio de R$2,5bi (DRU APROVADA NO CONGRESSO POR PARLAMENTARES ELEITOS POR NÓS). Os Estados ficarão desonerados de dívidas e merecedores de créditos de R$6 bi (APROVADO NA CÂMARA POR PARLAMENTARES ELEITOS POR NÓS).
O que pode acontecer:
a) Aprovar o quanto antes na Câmara Federal o projeto da regulamentação da EC-29 ao qual não cabe mais nenhuma alteração, mas apenas a rejeição ou manutenção de um destaque referente à criação da CSS.
COMENTÁRIO: SEM CSS PERDA DE R$ 6 BI; COM CSS GANHO FINAL (APÓS DESCONTO DE PERDAS) DE APENAS R$ 4 BI
b) Se aprovada a CSS do projeto da Câmara, o Senado faria um mix dos dois projetos a partir do seu que aloca um % da Receita Corrente Bruta em percentual escalonado. O mix seria a íntegra do Projeto do Senado acoplado com os artigos de criação da CSS.
COMENTÁRIO: GANHO DO USO DO CRITÉRIO DO PERCENTUAL DA RECEITA; SEM PERDA DOS R$6 bi do FUNDEB.
c) Se rejeitada a CSS do Projeto da Câmara o Senado rejeita o projeto da Câmara e automaticamente está aprovado o seu que deve ser encaminhado ao Presidente Lula para sanção.
d) Depois pressionar o Presidente Lula para que não faça o que julgo uma ameaça bravateira. Lula disse mais de uma vez pela mídia: “Se chegar ao palácio, para eu sancionar, uma lei que aumente os recursos federais para a saúde e que não diga de onde vem o dinheiro, eu LULA irei VETAR”.
5. CONCLUSÃO
Sofreremos as conseqüências do “passa-moleque”, aprovado na Câmara, de subtrair cerca de 50 bi da base de cálculo dos 12% (R$6 bi) da saúde, devidos pelos Estados. Com isto o astral da saúde vai desde a perda de R$6 bi até o ganho mínimo de R$ 4 bi, se for criada a CSS.
Historicamente a saúde, mais uma vez, será usada para mendigar recursos junto à sociedade que acabam por financiar outras áreas. Para a saúde, como sempre, restarão algumas migalhas!!! Aconteceu assim com a Contribuição do INSS, com a COFINS, com a CPMF e agora acontecerá com a CSS????!!!! Pobre saúde, menina de rua alugada para angariar recursos e depois, extorquida do arrecadado por terceiros, exploradores perenes.
Sairemos deste sufoco de 2000 a 2009, após aprovada esta lei de regulamentação da EC-29, já de pires na mão para buscar outras formas de financiamento da saúde.
A quem pedir explicações? A quem responsabilizar? Governo? Parlamento? Judiciário? Ministério Público? Ou a todos nós cidadãos que continuamos, no coletivo, ignorantes, não participantes, não conseqüentes, péssimos eleitores de governantes e parlamentares???
Para mim, caímos fundo numa cilada e por afirmar assim prevejo meu apedrejamento em praça pública...!!! Nada diferente de quando, em plena votação da EC-29 denunciei que a modificação feita na PEC 169 seria um engodo (como foi) onde a União (leia-se FHC+Malan+Serra+parlamentares) se desresponsabilizou do financiamento da saúde e ainda onerou mais a Estados e Municípios. A prática no tempo mostrou exatamente isto. O maior valor per capita federal (atualizado monetariamente) para a saúde foi em 1999, ano anterior à aplicação da EC-29: R$278.
Ao contrário, se mantida CSS com perda de mais da metade, como está hoje na legislação, tenho certeza que mais uma vez serei execrado e muitos irão comemorar: “pelo menos se definiu o que são ações e serviços de saúde e a saúde irá recuperar algum dinheiro a mais, hoje sonegado pelos Estados!!!” Comemorar o quê? que não teve nem DENASUS, nem CGU, nem Ministério Público, nem Judiciário capazes de fazer MINISTÉRIO DA SAÚDE, ESTADOS E MUNICÍPIOS cumprirem aquilo que já é de clareza meridiana na Constituição Federal e na Lei Orgânica da Saúde: O QUE SÃO E O QUE NÃO SÃO AÇÕES E SERVIÇOS DE SAÚDE. Comemorar o óbvio já definido, mas sofismaticamente negado pelas esferas de governo, principalmente os Estados?
Fiz algumas simulações que vale a pena comentar, tomando os seguintes dados como base:
Orçamento do Ministério da Saúde previsto para 2010 é de R$57,173 bi.
Receita Corrente Bruta da União para 2010 é de R$853,6 bi.
A CSS se aprovada nas bases da Câmara, ao valor de 0,1% arrecadará cerca de R$12,5 bi em 2010. Com o desconto da DRU (20%) ficaria líquido R$10,0 bi. Com a perda de R$6 bi da retirada dos recursos da FUNDEB que os estado deixarão de colocar em saúde, restam apenas R$4 bi.
Usando os dados acima teremos as seguintes simulações possíveis de recursos da União para a saúde em 2010.
a) Valores atualmente alocados: R$57,2 bi. SAÚDE FICA IGUAL HOJE.
b) Valores estimados com a aprovação na Câmara do PLP 306 – sem a CSS: R$57,173 que no total da saúde terá a subtração de R$6 bi o que resultará em R$51,2 ou seja menos que o de hoje. SAÚDE PERDE R$ 6 bi.
c) Valores estimados com a aprovação na Câmara do PLP 306 – com a CSS aprovada e já descontadas as perdas (DRU+FUNDEB) R$ 61,2 bi. SAÚDE GANHA APENAS R$4 bi.
d) Valores estimados com a volta ao projeto original do Senado rejeitando-se o da Câmara: R$72,5 bi. SAÚDE GANHA R$15,3 bi.
e) Valores estimados com a volta ao projeto original do Senado com manutenção da CSS aprovada na Câmara R$82,5bi. SAÚDE GANHA R$25,3 bi.
A estratégia de luta tem que se focar agora em:
1) Aprovar o projeto da Câmara com a criação da CSS.
2) Aprovar o projeto original do Senado rejeitando totalmente o da Câmara, ou, no melhor dos mundos aproveitada a criação da CSS.
QUEM VIVER VERÁ? Não nos esquecermos que a saída para a saúde é complexa e passa pela “Lei dos 5 mais: MAIS BRASIL; MAIS SAÚDE-SUS; MAIS EFICIÊNCIA; MAIS HONESTIDADE E MAIS RECURSOS.”
Como dizia o mestre Darcy Ribeiro: "EXISTEM DUAS OPÇÕES NA VIDA: RESIGNAR-SE OU SE INDIGNAR E EU, NÃO VOU ME RESIGNAR, NUNCA"