Gestão da saúde e o projeto de reforma da administração pública
Lenir Santos
O Governo Federal, Ministério do Planejamento, vem debatendo o anteprojeto de lei que organização a administração pública, elaborado por um grupo de juristas. O anteprojeto foi elaborado de maneira livre pela Comissão e entregue ao Ministério do Planejamento no final do ano passado.
O anteprojeto tem por finalidade reorganizar a administração pública pautada nos dias de hoje pelo decreto-lei 200, de 67. Destacam-se a regulamentação do contrato de autonomia, conforme previsto no art. 37, § 8º, da CF, a fundação estatal e as formas de colaboração entre o Poder Público e os entes privados sem finalidades lucrativas.
Também merece ser destacado as formas de controle da administração pública que faz uma opção clara pelos controles de desempenho e controles concomitantes ao ato administrativo ante os controles a posteriores que são os que mais existem nos dias de hoje.
A administração pública não mais suporta manter-se isolada das reformas que a sociedade sofreu com a globalização dos mercados, continuando fechada num modelo de 1967, que mesmo com as tentativas de reformas ao longo desses anos, dentre elas a de 1998, Emenda Constitucional 19, não conseguiram melhorar a gestão pública, em especial a da saúde.
A saúde pública exige uma modernidade que a administração pública não conseguiu ainda lhe dar, mantendo-a amarrada a controles que mais atrapalham a gestão do que a protegem.
A agilidade necessária para atuações que tenham por finalidade dar efetividade aos direitos sociais tem sido postergada, perdendo-se a gestão pública num cipoal de normas, regulamentos, cada dia mais fechados num sistema de controle do gestor público, sem contudo ser capaz de evitar a corrupção e garantir melhor qualidade e desempenho dos serviços públicos.
A lei de responsabilidade fiscal, com todos os seus méritos, impõe à saúde uma camisa de força no tocante aos percentuais de pessoal incompatíveis com área que gasta 80% de seus recursos com pessoal.
A gestão compartilhada do SUS, que exige novas formas de os entes federativos se relacionarem para manterem a regionalização de serviços, até hoje não se concretizou, exigindo dos gestores públicos da saúde a criação de arranjos administrativos importantes, mas nem sempre reconhecidos fora da área da saúde, seja pelos órgãos de controle, seja pelo próprio Judiciário.
O teto salarial dos prefeitos como limite para o pagamento de pessoal também gera dificuldades na manutenção de profissionais médicos que ficam instados a salários muitas vezes inferiores da R$2.000,00.
Por outro lado, a ausência de fixação das competências e responsabilidades dos municípios de menor porte perante a garantia da integralidade da assistência à saúde, determinando o Judiciário que a competência dos entes federativos é solidária, também gera grandes embaraços à gestão pública da saúde por obrigar um município de cinco mil habitantes às mesmas responsabilidades de um município de um milhão de habitantes.
Essas e outras questões da gestão pública da saúde precisam ser resolvidas e essa é a oportunidade de se incluir no projeto de lei, as especificidades da saúde, como a articulação federativa, a intersetorialidade, a necessária complementaridade dos serviços privados na rede SUS, que até hoje não conseguiu encontrar um caminho claro, transparente, complementar (e não substitutivo) que se encontre com a realidade diária exigente de respostas rápidas dos gestores públicos da saúde que não podem ficar presos a controles e regras que tolham a sua capacidade de agir, o seu poder discricionário e a busca por uma gestão que atenda o interesse público e garanta a efetividade do direito à saúde de maneira qualitativa.
É o momento de a saúde – seus órgãos, setores e instituições – se unir em torno do projeto, promovendo estudos, debates e apresentando ao Ministério do Planejamento propostas de aperfeiçoamentos no anteprojeto de lei que atendam à gestão pública da saúde.