Não é de hoje que venho acompanhando casos de indeferimentos sumários na ordem crescente em que a ANVISA, por ausência de documentos, vem colocando fim em procedimentos administrativos interpostos por entes regulados para registro de produtos ou atividade diversa com a consequente perda do pagamento da taxa a favor da Agência. Entretanto, referida norma balizadora da decisão em que se apoia o ato, ao que se tem, não encontra fundamento em lei especial e, pior, contraria norma constitucional e lei federal. Referido fato despertou o interesse em investigar o caso.
O inciso II, § 2º do art. 2º da RDC 204/2005 reza que “não são passíveis de exigência técnica as petições que não estiverem instruídas com a documentação exigida quando do seu protocolo, a insuficiência da documentação técnica exigida quando do protocolo da petição enseja no indeferimento da petição”.
Pois bem. O preâmbulo da Resolução menciona artigos de leis e decretos que não tratam diretamente do indeferimento sumário e o direito à perda da taxa. Em nenhum momento, ao estudar o tema, se encontrou qualquer previsão legal para o indeferimento sumário e perda da taxa em favor da Agência conforme preconiza a RDC 204/2005. Nem a lei, nem a Constituição Federal previu referido ato que, a olhos mais atentos, vem causando verdadeiro temor financeiro ao contribuinte/regulado que paga por um serviço e, da forma feita, assiste algemado o Estado deixar de desempenhar seu papel sob argumentos que contrariam princípios de ordem constitucional e administrativa. Em especial os princípios da legalidade, moralidade, finalidade e eficiência do ato (art. 37 CF).
Positivado no ordenamento jurídico, o artigo 5º, inciso LXXVIII da Constituição Federal, anuncia que os processos devam se desenvolver em tempo razoável, de modo a garantir a utilidade do resultado alcançado ao final da demanda. E mais, aplicando-se ao procedimento administrativo, subsidiariamente os preceitos da Lei 9.784/99 que “regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal”, resta reservada à Administração o dever de explicitamente emitir decisão nos processos administrativos e sobre solicitações ou reclamações, em matéria de sua competência. Além disso, a mesma lei ainda assegura: “O interessado poderá, na fase instrutória e antes da tomada da decisão, juntar documentos e pareceres, requerer diligências e perícias, bem como aduzir alegações referentes à matéria objeto do processo”. Como se não bastasse ainda determina: “O administrado tem os seguintes direitos perante a Administração, sem prejuízo de outros que lhe sejam assegurados: I - ser tratado com respeito pelas autoridades e servidores, que deverão facilitar o exercício de seus direitos e o cumprimento de suas obrigações; II - ter ciência da tramitação dos processos administrativos em que tenha a condição de interessado, ter vista dos autos, obter cópias de documentos neles contidos e conhecer as decisões proferidas; III - formular alegações e apresentar documentos antes da decisão, os quais serão objeto de consideração pelo órgão competente”; [...]
Portanto, anunciado o entendimento de que o indeferimento de que trata a RDC 204/2005 contraria norma constitucional e, por isso, poderá ter afastados seus efeitos com a consequente manutenção do processo, a juntada das peças necessárias para sua tramitação no intuito de garantir a utilidade do resultado a ser alcançado ao final do pleito. Quando não, seria no mínimo moral, impor-se a restituição da taxa travando, assim, o equilíbrio financeiro entre agente regulador e agente regulado, que é o que se busca.
Cumpre aos regulados atentar para o caso e buscar seus direitos. A agência já pacificou seu entendimento e não resta alternativa se não a via judiciária.